Agora, os seus olhos desidratados, fechados em um corpo sem vida deitado na madeira fria, sem nenhum forro para aquecer a sua última morada, não mais diriam o que eu tanto queria saber:
- Ela me amou? - Essa foi a pergunta que eu nunca fiz, nem a mim mesmo, pois a resposta ficaria legada ao silêncio.
O seu velório tinha o som dos solitários, o silêncio sepulcral. Diante de mim havia apenas o seu esquife, nenhuma vela acessa com a sua chama extinguindo significando o fim da vida, nenhuma flor perfumando o ambiente e significando o reflorescimento, a continuação da vida em outro plano. Não, não havia nada disso, apenas o silêncio, o seu corpo morto e eu com uma rosa branca na mão. Sentindo-me estranho naquela despedida, eu pedi ao coveiro que acelerasse o sepultamento. Ela, quando viva, já estava morta e enterrada. Que se jogasse logo a pá de cal.
Os seus olhos gris sempre trouxeram tristezas descomunais, incompreensíveis. Tentei várias vezes lê-los, saber o quê se escondia por trás dos seus sentimentos, porém os seus olhos se mostravam indeléveis. Nunca a vi chorar, os seus sentimentos se expressavam pela secura, não lhe havia umidade. Vivendo o seu sertão, o seu coração rachado buscava preencher as rachaduras com sentimentos que ela não encontrava no nosso lar.
Não sei se por medo da resposta, ou por medo de perguntá-lo, magoando-o, o meu pai silenciava quando ela saía à noite, e com essa atitude, eu sabia que o silêncio seria a resposta para a pergunta nunca feita. E assim foi, ad infinitum, as saídas noturnas dela, o silêncio dele, os meus olhos incompreendidos querendo uma resposta. Eu só a saberia anos depois.
Os meus olhos ganhavam um colorido quando ele adentrava sob a coberta me despertando. Não havia tempo de lhe responder bom dia, pois nos meus lábios havia um sorriso descomunal impedindo a fala, porém, ao se pôr de pé com a mão aberta esperando o encontro da minha, levando-me ao banheiro e depois à mesa para o café da manhã, eu lhe dizia - carregando em cada palavra a felicidade de quem é amado -, bom dia querido pai! Ele não se dava ao trabalho de abaixar a cabeça para retribuir a gentileza do bom dia, fazia melhor, pegava-me no colo e quando nossos olhos se encontravam não havia necessidade das palavras, a nossa felicidade falava por si só. Assim crescemos, sem nunca abaixar a cabeça um para o outro, pois nos respeitávamos, e quando a elevávamos era em agradecimento aos céus por ser nossa relação um eterno ensinamento e pratica de amor entre pai e filho. Indiferente a esse amor minha mãe passava os dias gris, tristes, cumprindo a sua tarefa de dona de casa, relegando o seu papel de esposa e mãe ao depois. Se houve alegria em sua vida, ela nunca demonstrou durante o dia; durante a noite, com suas saídas nunca explicadas, eu não saberia dizer se houve. Porém o depois chegou, mas já era tarde para ela recuperar o papel de esposa, o de mãe seria impossível, pois ele é inerente a toda mulher, tanto é que não há a necessidade de dar a luz para ser mãe, a maternidade é uma condição divina. Essa condição disposta por Deus a todos as mulheres, ela não tinha.
Eu sempre pensei que ninguém é bom o suficiente para merecer a santidade, contudo eu vim saber o verdadeiro significado de santidade quando o meu pai, sempre verdadeiro no seu modo de agir quando no de falar, contou-me a verdade sobre mim. Primeiro me disse que eu já tinha idade para compreender e absorver o que ele haveria de contar. Eu estava com dez anos.Continua.
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Pronto, Eder, a curiosidade está me consumindo, já.
ResponderExcluirUm beijo.
SOU MYRA COMO ANONIMO!
ResponderExcluirpois o começo é muito bom, demais, triste mas cheio de amor, espero com entusiasmo a continuaòao, meu gde escritor!
beijo com admiraçao, sempre
Deixou o gostinho da continuação para o leitor. Uma história triste, com momentos alegres, a relação com o pai, uma relação bonita.
ResponderExcluirNo aguardo. beijo
...vamos esperar a continuação.
ResponderExcluiré claro que virá com requintes
de encanto pela alma linda
do escritor.
bjokas, moço querido!
Fiquei curiosa! Mas a história até aqui me pareceu triste. bjo
ResponderExcluirhummm fiquei tão curiosa e tecer possibilidades aqui do que ele irá revelar a você.
ResponderExcluirConta logo!
Beijos, Eder
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ResponderExcluirVou acompanhar a sua história... Seu jeito de contar as coisas, prendem a atenção!
Beijos de luz e o meu carinho!!!
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Olá Éder,
ResponderExcluirFico pensando: qual será o final dessa história?
Menino, você escreve bem, hein?
Estou adorando, parece até seriado de TV.
Um grande beijo,
Maria Paraguassu.
Eder,
ResponderExcluirRomanceiro,romancista não sei qual é o modo correto de dizer,mas gosto muito de ler seus textos sempre com toque irônico,intrigante e falando de argumentos bem reais.
Abraço carinhoso,
Oi Eder,
ResponderExcluirE teu texto me leva...é ele é tão real.
Volto... volte logo.
Beijo meu
Uma mulher sem a condição materna... isso sim é algo difícil de encontrar, porque mesmo escondidinho lá naquele cantinho do coração que ninguém vê, toda mulher sempre tem, me maior ou menor porcentagem, a capacidade-vocação para sser mãe...
ResponderExcluirUma história gris e triste, como o próprio nome indica... e a curiosidade que agora me corrói por dentro... hahahahaha...
Beijos, flores e muitos sorrisos, meu amigo!
Como já comentei esse post, deixo um beijo de bom fds, Eder.
ResponderExcluir=*
Eder, querido!
ResponderExcluirMais uma narração linda, linda!
O pai e a filha... as relações nos fazem poesia e marcam tanto. Adoro falar de meu pai. Ele foi meu primeitro grande amor.
Vou lá no seguinte!
E ... perdoe! Perdoe toda esta demora!
Abraço forte