Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

domingo, 27 de outubro de 2013

Aos meus amigos


Aos meus amigos:

Tenho-os como flores, peço-lhes apenas uma pétala para que eu possa colocar entre as folhas do livro da minha vida, e se por algum motivo, a distância nos afastar, eu possa, ao folhear o meu livro, com as lágrimas das saudades, revivê-los para nunca esquecer o significado que cada um tem.


Meus amigos, um novo conto infantil seria postado nesse domingo, contudo, outros afazeres me impossibilitaram de programá-lo. Estou finalizando um livro e ele está tomando o meu tempo, também, estou editando alguns contos inéditos para ser transformado em ebooks e serem vendidos pela Amazon.com. A quem interessar é necessário cadastrar na Amazon.com clicando AQUI e baixar o aplicativo ( PC, Tablet, Celular ) para ler o livro AQUI, tudo gratuito. Na Amazon, você encontra livros gratuitos e com preços acessíveis. Aproveito a oportunidade para indicar dois ebooks da minha amiga Camila Monteiro, clique Aqui e os compra, saindo cada um por 1,99. Fala sério, preço de produto de loja de variedade, mas com qualidade superior a produtos importados, e não é produtos da China, tá... rssss.
Bem, vai preparando o dindin para gastar com os meus ebooks e quem sabe presentear os seus amigos, afinal, o Natal está chegando.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

A família encantada - Última página

- Sabia que você iria entender, Fauser. Sabe, você tem os olhos de seu pai.

- O senhor conhece o meu pai?

- Sim, sim, ele era um rapaz, mais velho do que você, e fizemos esse mesmo passeio juntos. Eu sou o Senhor do Tempo, e vim lhe mostrar que sempre há tempo para consertarmos aquilo que não está funcionando tão bem quanto deveria estar.

Agora, segue de volta para sua casa, filho, mas não se esqueça de levar contigo os três objetos que encontrou na garagem. Ainda se lembra deles?

Apertando a bola de gude com toda força em sua mão, o menino respondeu: Sim, me lembro bem de cada um deles. Posso levar a formiga também?

Essa, já subindo no manto do Senhor do Tempo, deu uma risada e respondeu-lhe assim:

- Meu anjo, mas não percebeu que eu já estou lá dentro de sua casa, junto de você, desde que você era um bebê?

E, brilhando em uma bola de luz, abandonou sua forma pequena e franzina de formiga, e transformou-se em Baba.

O dia já ia alto, e, quando Fauser entrou em casa de mãos dadas com Baba, seus pais pareciam ter sido atropelados por um caminhão.

- Onde você estava? Disse-lhe a mãe, correndo em busca de seu abraço.

- Procuramos em toda a vizinhança por você, Fauser! Chamamos até a polícia! E, caindo a seus pés, seu pai, não segurando a emoção, rompeu em lágrimas.

- Está tudo bem agora, disse-lhes Baba, acalmando aos três. Encontrei-o na garagem, dormindo ao lado desses objetos. Vocês os reconhecem? E, dando um passo ao lado, deixou-os ver a bicicleta grafitada e a bola de capotão.

Cacau e Mel entreolharam-se, e um arrepio subiu-lhes por toda a espinha.

- Meu filho, você estava lá com esses brinquedos? Docemente perguntou-lhe Cacau.

- Foi estranho, meu pai. Eles ganharam vida, falavam entre si. E, depois veio um homem que disse ter lhe conhecido há muito tempo, quando você era criança. E Baba, ela era uma formiga, mas se transformou em gente BEM NA FRENTE DOS MEUS OLHOS.

Nada mais faltava ser dito. Ali, debaixo dos olhos de Cacau e Mel, sua história recontada, através das mãos, sedenta de carinho, de seu filho. Beijaram-lhe a fronte. Disseram-lhe, descanse, meu filho, e foram com ele até o quarto.

Baba a tudo observou, com o sorriso de canto e os olhos rasos de água que lhe eram tão familiares. Cacau deteve-se no corredor em direção aos quartos. Deu meia volta, dirigiu-se à Baba assim:

- Minha amiga formiga, e eu nem por um segundo desconfiei que era você quem o sono e a vida de nosso filho velava! Obrigado, muito obrigado! Diga ao Senhor do tempo que entendemos a mensagem. Não tornará a se repetir, isso eu prometo. Palavra de menino. Dizendo isso, piscou seu olho direito, o mesmo olhar de jabuticaba gigante que Fauser havia herdado de seu pai.

- Meu trabalho se encerra aqui então, rapaz. Voltando à sua forma de formiga, despediu-se do amigo, mas, antes de partir, ainda teve tempo de acrescentar:

- Lembra-se que eram três, e não somente dois, os objetos de sua infância? Seu filho carrega consigo algo de muito precioso, algo que você, ao longo do tempo, esqueceu-se de amar...

Encontrou Fauser adormecido em sua cama. Podia ver o sorriso em seus lábios, ainda tão pequeninos. Ao ajoelhar-se ao lado do filho amado para beijar-lhe a face, como nunca havia tido tempo para fazer, percebeu algo esverdeado na mão esquerda do menino. Esticou sua mão para alcançá-lo, e, seu coração sobressaltou-se quando viu que era sua bola de gude, aquela que havia dado a Mel em honra de seu amor...

O Senhor do tempo, satisfeito com o que viu, esticou seu manto do tempo e provocou a sua passagem. Nem muito rápido, nem muito devagar. No ritmo certo para que muitos aniversários fossem celebrados, muitas conquistas fossem alcançadas, alguns fracassos fossem superados. A tudo o Senhor do tempo tratou com igual cuidado.

Mas agora já não era Fauser a levantar-se da cama, acordado por um barulho diferente vindo do lado de fora da casa. Era Vitor, o neto de Mel e Cacau, que dormira na casa dos avós para que seus pais pudessem sair. Vitor sentia-se o menino mais amado do mundo, pois seus pais e seus avós desdobravam-se em cuidados com ele. Tinha apenas 7 anos, mas a certeza de que era o menino mais amado do mundo.


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images


domingo, 20 de outubro de 2013

A família encantada - Sétima página

Fauser olhou ao seu redor. Não reconheceu a casa. Era a mesma em que morava, mas estava... vazia. De repente, a porta abre e entram seus pais. O menino quase sai correndo para abraçá-los, mas percebe que não está em cena. Estranhamente assiste a algo que está guardado no passado, mas que, de alguma maneira, ele parecia lembrar. 


Seus pais brigavam. Era evidente a angústia que sentiam. A mãe balançava papéis em suas mãos, o pai levava as mãos a cabeça, em sinal de desespero. A barriga da mãe grande, quase no final da gestação.

O pai bate a porta. A mãe cai sentada, aos prantos, alisando a barriga... Nesse ponto, Fauser sente seu próprio coração acelerar:

 - Ela me ama!!

Num apagar e acender de luzes, o menino agora vê seu pai no trabalho. Que horas são, não vejo mais ninguém! Não há luz fora da janela. O relógio roda, descontrolado, as horas não param, o calendário não para, tudo gira em um caleidoscópio acelerado, mas uma imagem, de repente, congela-se: sobre a mesa de trabalho, Cacau tem uma fotografia de Mel e o pequeno bebê nos braços.

- Ele também me ama!!

Um sol, no meio da noite, brilha. E, de seu halo, surge a imagem de um senhor, muito velho, mas de uma presença imponente.
- Rapaz, como você cresceu!

- Eu sou menino, não sou rapaz... E, nos conhecemos de algum lugar?

Rindo, como se não tivesse ouvido aquela resposta, o Senhor continua a falar:

- Rapaz, você sabe por que está aqui?

Pensando o mais rápido que pode, Fauser começa a responder assim:


- A princípio, achei que iria me esconder, fugir quem sabe. Mas, ao ver todas essas imagens, entendo que não me faltou amor - faltou TEMPO para que meus pais o dessem a mim. Ai, Senhor, peço-lhe ajuda! Como faço para que meus pais entendam que todo o sacrifício, todo o esforço que fazem por mim, não é nada se não tiver também o seu amor?

Continua quarta-feira às18hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A família encantada - Sexta página

Na ânsia de tudo prover ao menino Fauser, deixaram de, em primeiro lugar, oferecer-lhe, sem limite ou racionamento, o presente que todos mais anseiam: o AMOR.

E, prezados amigos, posso lhes garantir. Amor há - cabe a nós ajudá-los a encontrar.

- E o que vocês estão ainda fazendo aí? Um Fauser, de pijamas e descabelado, com os olhos arregalados, ouve o final do, muito bem elaborado, discurso da bola de capotão.

Vamos, precisamos encontrar o AMOR. Por mim...
A formiga, prosa que só, embaixadora do Senhor do tempo, olha o menino e diz:

- Mas você cresceu! Já é um rapaz!

- Eu não sou rapaz. Eu sou menino...

Sorrindo, todos os quatro percebem que a ajuda certa fora providenciada...

- Está bem, não vamos perder tempo. Agora, atenção: no três nós pulamos.

- No quê?

- Na bola, ora!

- Aquela que está parada ali?

- Isso mesmo, vamos, não há tempo, daqui a pouco o portal fecha.

- Peraí, vou levar a bola de gude. 

Pendurando-se na barra da calça de pijama de Fauser, a formiga chuta a bola de gude para o alto, a tempo de ser alcançada pela mão esquerda do menino. E uma descarga elétrica boa passou por dentro da bola, que, mesmo sem lábios, sorriu...

- Chegamos.

- Mas estamos no mesmo lugar!


- Não foi o lugar que mudou, foi o tempo!

Continua domingo às 8hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images

domingo, 13 de outubro de 2013

A família encantada - Quinta página


Fauser levantou-se da cama, abriu a porta e espreitou pela fresta. O corpo da babá fulgia e de sua mão pendia uma varinha de condão. Minha fada madrinha! Fauser pensou alto. Voltou para a cama e adormeceu.
Mas essa noite não era como as outras. Após poucos minutos de sono, um barulho diferente fez com que Fauser acordasse. Ainda esfregando seus pequenos olhinhos com sono, foi à janela, e, arregalando os seus olhos de jabuticaba além da grade de proteção, não acreditou no que estava vendo.

Uma formiga levantava a porta da garagem!

A formiga, amiga de infância de Cacau, estava atarefada. O Senhor do tempo havia a encarregado de buscar uma solução para  vida sem amor que Cacau e Mel estavam levando. Mas, para isso, era preciso que forças fossem unidas. A formiga precisava encontrar os três objetos inanimados que mais amavam àqueles dois cabeças-duras! E, na garagem da casa,  achou a bola de capotão descosturada numa caixa de sapato, a bola de gude como olhos de uma das bonecas de Mel e a bicicleta entre os ferros velhos.

- Que desperdício! Mas, não há tempo para lamentações! O portal não abre muitas vezes e ainda há muito que fazer! O que vocês estão precisando é de água para encantarem. E, conforme ia dizendo essas palavras, as três receberam os esguichos de água vindos da mangueira do jardim.

O encanto começava a fazer efeito. Sacudindo-se tal qual cachorro, a bicicleta reviveu; a bola de capotão, apesar de descosturada, espirrou dando sinal de vida; e a bola de gude saltou do olho da boneca e saiu rolando pela grama molhada, deixando um rastro de alegria.

 As três disseram em uníssono:

- Você voltou!!!

- Sim, sim, mas não temos tempo, aliás, temos o tempo que o Senhor do tempo nos concedeu. E é pouco, muito pouco, mas pode operar milagres na vida dessa família. E pensar que Cacau e Mel eram tão atenciosos com vocês! Tsc, tsc, tsc... Tínhamos certeza de que seriam bons pais. Agora vocês me respondam, onde foi que eles erraram e entraram nesse caminho sem vida, sem alma?

A bola de gude, desde sempre a mais falante, e de longe a mais pessimista, fez um relato breve, sempre é claro, do seu ponto de vista:

- Mas ora essa, dona formiga, eu disse que os dois iriam nos esquecer. Essas coisas de homem e mulher atrapalham muito o discernimento das pessoas. Pois se acreditam, com toda a força, que para ser grande é preciso esquecer-se de quando era pequeno! E eu agora é que lhes pergunto: como eles podem criar uma criança se perderam sua essência?

A bicicleta, sempre suave e gentil, tão magoada que estava, resolveu participar também da conferência:

- Veja só, dona formiga, se é possível tal estapafúrdio: Eu aqui, linda, girassóis grafitados e azul da cor do céu, e eles comprando coisas que precisam ficar presas na parede! Fauser NUNCA nos viu! Acho mesmo que (agora ela está sussurrando, pois detesta fazer fofoca) jamais andou num selim de bicicleta!

A indignação foi geral. Um festival de "assim não dá", "isso precisa acabar", foi ouvido, até que, numa surpresa danada, a bola de capotão pede a palavra:

- Eu fui presenteado a Cacau no mesmo dia em que ele conheceu a Mel. Pude ver em seus olhos o amor brotando. E o amor é o gesto sublime que eleva os seres humanos. A vida, no entanto, os engoliu. Na máquina que, hoje, gira o mundo, não há mais tempo para ser feliz - a menos que esse artigo esteja à venda em uma prateleira, perto dos aparelhos eletrônicos.

E, esses subterfúgios escondem a triste realidade desse casal que, outrora, era criança: eles desaprenderam a amar. Esqueceram-se que é o sentimento mais completo, e, no entanto o mais simples de se dividir.

Continua quarta-feira às18hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

A família encantada - Quarta página

Fauser, ainda bebê, ganhou o seu primeiro presente, dado pelos pais. Um televisor LCD. Todavia, o que Cacau e Mel deixaram de notar é que Fauser só tinha olhos para eles. Na sequência, quase ininterrupta, vieram o aparelho DVD, juntamente com as mídias DVD de contos de fada. 

O tempo passava, e Fauser pouca oportunidade tinha de passar com seus pais. Sequer os conhecia pela voz. A babá, dedicada, trazia de sua casa os livros com as histórias que lia para a linda criança. Fazia isso por amar toda criança que cuidava. 

Aos sete anos, Fauser ganhou um vídeo game, por fim um computador. A sua vida resumia aos metros quadrados do seu quarto e aos passeios para brincar na pracinha do condomínio fechado em que moravam. Sempre acompanhado de sua babá.

Entristecido pela criação que Cacau e Mel estavam dando ao filho, o Senhor do tempo incumbiu à formiga a missão de recobrar o encanto dessa família.
Sobre o céu, a noite trouxe o manto que escureceu o dia. Pipocou-o com estrelas, clareando-o. Chamou seu amigo vento para que soprasse as nuvens que teimavam em permanecer sob a sua obra de arte, e com o dedo indicador fez uma bola no canto do céu. Com um suave beijo, se fez luz. A noite enluarou-se.

A babá, admirando a beleza da noite, não fechou a janela do quarto do Fauser, encostando apenas a cortina. Quando se encaminhava para a porta, Fauser segurou-a pela mão...

 - Por que papai e mamãe não me amam, Baba?

- Eles amam sim, meu anjo! Eles são muito ocupados, precisam trabalhar.

- Por que eles precisam trabalhar, Baba?

- Vamos fazer uma brincadeira. Feche os olhos. Agora, imagine-se sem tudo isso aqui. Você seria feliz, meu anjo?

- Sim, se eles me amassem. Baba, quer ser minha mãe? Eu te amo tanto.

Os olhos da babá marejaram. A emoção a silenciou. Fauser continuou falando.

- Baba, meu sonho era viver em um mundo encantado, ter uma fada madrinha. Mas isso não existe, não é verdade, Baba?

- Existe sim, meu anjo. Basta acreditar. – Disse entre lágrimas.

- Então você é minha fada madrinha?

Desfazendo-se em lágrimas, a babá o cobriu, beijou o seu rosto e sussurrou em seus ouvidos:

- Sim, meu anjo, eu sou, mas isso fica sendo nosso segredo. 


Ao sair, ela encostou a porta.

Continua domingo às 08hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images

domingo, 6 de outubro de 2013

A família encantada - Terceira página

Ao se darem as mãos, a bola de gude foi tocada pela mão da Mel e, nesse instante, percebeu qual era o sentimento que estava aflorando das linhas da mão do Cacau. A bicicleta teve a mesma sensação quando Cacau apoiou a sua mão no selim grafitado de girassóis. Os girassóis se abriram como se aquela mão carregasse raios de sol.

As duas, juntamente com a bola de capotão, sabiam que a amizade dele por ela estava sendo substituída pelo amor. Seriam relegadas ao esquecimento. E, aconteceu como a bola de gude havia previsto: a bicicleta foi deixada em um canto da garagem misturada aos restos de ferro velho. A bola de capotão, murcha, foi enterrada em uma caixa de sapato entre outros badulaques. A pobre bola de gude teve outro, lamentável, destino: esfumou-se entre bonecas quebradas, até ser confundida com um olho de uma.
Os dois estavam sentados na beira do cais, jogando os pés ao vento e migalhas de pão aos peixes. Enamorados, entreolhavam-se encabulados, ela com o queixo no peito, ora olhando para os próprios pés dançando no ar, ora para ele. Ele, com olhos de vontade, esperava que o tempo o empurrasse à ação. 

O dia enamorando-se da noite, deixou-se ser encoberto pelo seu manto. Os ventos, trazendo aromas campestres, esfumavam as nuvens; as estrelas formigavam no céu, e a noite iluminava-se pelo lume do amado. A lua cheia brilhava mais do que de costume. Era a lua dos enamorados.

Cacau fez a sua mão andar tamborilando os dedos na mureta do cais até encontrar as mãos da Mel. Deu-se o encontro de mãos, olhos, e, finalmente, seus lábios se encontraram.

O Senhor do tempo, com grãos de areia, cobriu-os com o manto do envelhecimento, visto que o amor dos dois pedia pressa. O pó do tempo não acumulou nos vincos adquiridos com os anos, pois eles ainda não os tinham. Contudo, os amadureceu o suficiente para que perdessem suas características de criança. Ele o que tinha de rapaz,  tornando-se homem. Ela o que tinha de moça, tornando-se mulher. Casaram com urgência, e, logo, tiveram um filho.

A bola de capotão, por não ter os cordões untados com gordura animal, estava com alguns gomos descosturados, envelhecida. A bola de gude, devido ao desuso, permanecia jovem, apesar de algumas trincas. A bicicleta fora azeitada com bastante óleo, porém, a poeira acumulada no decorrer dos anos lhe dera uma aparência de abandono precoce.

Dedicados ao trabalho, Cacau e Mel deixaram de proporcionar ao filho, Fauser, o que a eles não lhes faltara: a infância. Já seria imperdoável, se somente isso tivesse feito, porém, fizeram pior. Deixaram de serem pais e delegaram essa função à babá.

Continua quarta-feira às18hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:


Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images


quarta-feira, 2 de outubro de 2013

A família encantada - Segunda página

Cacau e Mel, agora, viam o mundo pelos olhos um do outro. Por mais que o Senhor do tempo o acelerasse, e as mudanças fossem perceptíveis a todos, eles sequer as notavam, uma vez que enxergavam pelos olhos do amor, e a este tudo é atemporal.

Estava lá a mesma árvore, com várias camadas de primaveras, que um dia deitou seus galhos para que um pássaro de plumagem amarela entoasse uma canção dizendo: menino bobo. Agora que se encontrava marcada por dois corações entrelaçados, com os respectivos nomes de Cacau e Mel, a árvore pediu ao vento, entre gracejos, que levasse aos dois, além do aroma primaveril, estas duas palavras: amor bobo.

O vento, sempre gentil com a árvore, atendeu-lhe o pedido, carregando ambas as palavras. Os dois jovens, aos risos, saíram de mãos dadas, abobalhados, tropeçando nos próprios pés, tendo um ao outro como apoio. Para trás ficaram a bicicleta, a bola de gude e a bola de capotão no quintal da casa. Entreolhando-se, as três perceberam que tanto o menino quanto a menina estavam indo embora, prestes a se tornarem homem e mulher.


Os dois se retiveram no meio do caminho, com jeito de quem se lembrou de voltar para buscar algo muito importante. Cacau voltou feliz, ao ponto da própria felicidade pensar ser nele a sua morada. Ele corria saltitando, tocando os calcanhares um no outro. Mel o seguia a passos lestos.

Os dois, ao se aproximarem da bola de gude, da bola de capotão e da bicicleta, proporcionaram a esses três seres inanimados alegrias desmedidas. À bola de gude mais ainda, ao ser levada por Cacau. 

Porém, pela primeira vez, não reconheceu a mão a que estava tão acostumada. Os suores eram outros, a tremedeira descompassada não era a mesma, acusava sentimentos que ela desconhecia. A bola de gude se perguntou: em que linha da mão nossa amizade se escondeu?

O que ela não entendia era que as linhas das mãos de Cacau transpiravam outro sentimento. Sentimento esse que a bola de gude somente conheceria se tocasse as linhas das mãos de Mel.

- Toma. Ela agora é sua. – Disse Cacau a Mel, fazendo menção de entregar-lhe a bola de gude.

- Mas... – As palavras lhe fugiram.

- Esta bola me acompanhou até aqui. Um bem inestimável que lhe dou com prova da minha amizade.

Emocionada, Mel foi até a bicicleta. Como a bola de gude, a bicicleta soube de imediato que não eram mais as mesmas mãos que a tocavam.

- Toma. É sua agora. – Mel, com doçura nas palavras, entregou a bicicleta ao Cacau.

- Não. Não posso aceitar.

- Por quê? – Perguntou Mel decepcionada com a recusa.

- Ela vale mais do que a bolinha de gude.

- Que importância tem o valor monetário quando se AM... – Cacau não a deixou terminar a frase, beijando-a nos lábios.

Continua domingo às 08hs00min


TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS

AUTORES:



Água: Déia Tolda

Óleo: Eder Ribeiro 

Imagem Getty Images