Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Aonde o sol se esconde - Final

   Qual de nós nunca imaginou um final feliz para a história de nossa vida? Qual de nós, após o fim, nunca desejou o paraíso, a felicidade?
   O padre beijou o crucifixo, ajoelhou em agradecimento por ter sido salvo, em seguida curvou-se e beijou o assoalho do altar abençoando o único local que não foi maculado pelo sangue da carnificina, até então. Ao se levantar esbarrou na pia batismal quebrando o silêncio mortal. O policial, que até aquele instante pensava estar só, aguçou os seus sentidos em direção ao fundo da igreja. A fumaça provocada pelos disparos ainda permanecia no ar e o impedia de discernir qualquer objeto, porém ele tinha os outros sentidos. O disparo dado pelo policial em direção de onde veio o barulho atravessou o cérebro do padre, o arremessando ao chão; o sangue espargiu no ar e atingiu o rosto do noivo.
   O garoto que acabara de entrar pela porta traseira frustrou-se por não ter dado aquele disparo, por não ter aquela morte creditada à sua vingança. Ele caminhou até o padre, o cutucou com o cano do AR-15 para ter a certeza da sua morte; nervoso, olhou em todas as direções em busca de algo móvel. Vendo movimentos de feixes de luz, ele escondeu atrás do altar e apontou a sua arma.
   Na mão direita a arma do policial fumegava, na esquerda a lanterna foi ligada, e, a mão nervosa, apontava os feixes de luz em todas as direções à procura de mais alguém.
   O halo de luz surgindo em sua frente fez com que o noivo imaginasse que sua noiva veio buscá-lo para levá-lo lá aonde o sol se esconde; ele foi em direção à luz estancando o sangramento na barriga com uma das mãos. O policial disparou a arma, pois a mão do noivo colocado em sua barriga dava a entender que ele estava armado. O noivo correu em direção à luz gritando, vem meu amor, você veio me buscar, eu não tenho medo, vamos ser feliz sim, lá aonde o sol se esconde. Antes de atingir à luz, o noivo encontrou a bala no meio do caminho. Sua vista escureceu, sentiu tontura, tentou equilibrar, a luz da vida estava lhe fugindo, tudo em sua volta tornava-se branco, tão branco como o vestido de sua noiva.
   O garoto saiu de onde estava escondido com o AR-15 pronto para dispará-lo, mas ele se reteve, suas pernas tremeram, estático, ele não acreditou no que estava vendo. Cristo havia descido da cruz, com as mãos em chagas lhe pedia a arma. O garoto limpou os olhos, com certeza estava tendo uma alucinação, os esfregaram várias vezes a ponto de deixá-los vermelhos. Um sopro com aroma de alfazema chegou-lhe aos ouvidos pedindo a arma. Filho não guarda rancor em seu coração, a vingança só voltará contra si. Mas eles mataram os meus pais, não foi você que disse, dê a César o que é de César. E a Deus o que é de Deus, filho; e o que é de Deus é o amor, só através do amor você terá a redenção. As lágrimas desceram do rosto do garoto, um alívio imensurável tomou conta de sua alma. Quando ele se levantou, esbarrou no pedestal que estava a bíblia, a derrubando no chão; só então ele percebeu que o policial estava correndo em sua direção. O garoto saiu em disparada pela porta traseira da igreja, sem desespero. O policial, em seu encalço, o seguia descarregando a sua arma.
   Quando a brancura era a única cor que o noivo conseguia sentir, ele viu a sua noiva vindo em sua direção, pegar em sua mão, colocar a aliança em seu dedo e pedi-lo para colocar a dela. Os dois estavam unidos e banhados de luz. Ela lhe disse, vamos. Para aonde, perguntou-a. Lá aonde o sol se esconde. A felicidade está lá? Sim e não, respondeu-o. Como? Se ela estiver em você, estará lá também, mas se não, não. Ele não fez mais pergunta.

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9 comentários:

  1. O exercício da escria, isso vale. Fabular e aprender que outros mundos e outros modos de vida são possíveis, e não apenas este que está ai, plantando e colhendo violência como sua história mostra. E escrevendo aprimoraremos não apenas nosso texto, mas a nós mesmo. Escrevamos, pois.

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  2. Eder,abraço fraterno!
    Tudo é belo quando acaba bem assim como seu romance policial.A mim agradou acompanhar a leitura,embora, como havia dito anteriormente,não é meu gênero preferido porque sou muito melancólica com os dramas da vida,mas em todo caso você conseguiu prender nossa atenção em cada linha narrando com toque sutil literário o que faz parte da realidade de tanta gente,parabéns!

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  3. sim felizes parasempre em outro mundo...tenho certeza!

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  4. Há momentos em que não cabem mais perguntas... É estender as mãos e acompanhar quem nos quer bem!

    Como saempre faço uma viagem em suas escritas.

    Um abraço carinhoso

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  5. Pungente!Assustador e tão parecido com a realidade que cerca os morros e as periferias da cidade.
    Beijokas.

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  6. Gente do céu!!! Ei fiquei foi sem fôlego e sem palavras! Amei, amei, amei, amigo Eder! Seu conto foi simplesmente maravilhoso!
    E que venham outros!!! :D:D:D
    Beijos, flores e milhões de sorrisos!

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  7. Olá Eder...um amigo meu repete esta frase sempre que escuta falar em vingança...

    "Vingança é um prato que se come frio"...é a mais pura verdade...por isso não vale a pena...
    Belo conto amigo...arrebentando como sempre
    Um abraço na alma...beijo no coração amigo

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  8. Lá onde o sol se esconde! Foram neste lugar... onde algo maior os espera.

    Belo, meu amigo!
    Um cenário de dor e violência que foi explanado com a escolha perfeita de suas palavras. Vi um filme!

    Grande beijo!
    Eder, perdoe a demora!

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  9. Ui, esse me deu arrepios! Muito forte! Beijos

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