Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

sábado, 29 de outubro de 2011

Gris - Final

   - Vai lhe soar estranho o que eu vou lhe dizer, mas não posso mais lhe ocultar a verdade, vejo nos seus olhos muitas perguntas, e elas serão todas respondidas com o que vou lhe contar.
   Percebendo que meu pai estava dando voltas e não dizendo o que queria dizer, eu abri minhas mãos e as levei de encontro as suas. Seus olhos marejaram e os meus verteram em lágrimas quando me disse que não era o meu pai biológico. Estarreci-me, e me estupefique quando ele me disse que eu só era filho biológico da minha mãe. Pensando que as surpresas terminariam aí, ele me disse que encontrou minha mãe em uma de suas idas as boates noturnas no centro velho de São Paulo. Enojado da história que ele estava me contando, eu tentei tirar as minhas mãos das dele, mas ele não deixou. Perguntei por que ele casou com ela, ele me disse que não casou. A incompreensão abateu sobre mim, e mais ainda quando ele disse que ela estava grávida e não sabia de quem, pois ela era muito solicitada.
   - Sou filho de uma prostituta. - Gritei esperando que ele dissesse não. O sim veio através do silêncio.
   - Por que você ficou com ela? - As perguntas se acumulavam na minha mente. Enfim, ele respondeu.
   - Eu não fiquei com ela, mas sim com você. Nunca a amei, nunca tive relação com ela. Ela queria abortar. - Disse isso, e senti que as palavras lhe cortavam a garganta sangrando fel. - Para lhe ter, eu teria que ficar com ela, não tive opção, teria que abdicar do meu desejo de casar e ter filho. Percebi com o tempo que eu já tinha uma família, e ela se resumia a nós dois, e o amor que eu lhe tenho suplanta qualquer outro amor. Filho a vida é feita de escolhas, e as nossas escolhas depende de nossas vontades. A minha vontade era vê-lo saindo daquela barriga para a vida. Quando isso aconteceu, eu passei a enxergar o amor de uma forma diferente, o amor que vem da alma e não almeja o físico. Eu escolhi esse amor e não me arrependo.
   Ao terminar o seu relato, ele me pediu para perdoar a minha mãe, dificilmente faria isso. Ao deixar o quarto, o silêncio permaneceu entrecortado pelo seu amor, não havia mágoa, não havia dor, pois nunca tive uma mãe, apenas um pai e agora sabia que ele havia sido minha mãe também, me preenchendo com o quê nela faltava, a maternidade. Definitivamente eu tinha a certeza de que não precisava dar a luz para ser mãe e muito menos ser mulher.
   Em 1986 nós tivemos o melhor ano de nossas vidas. Ele entrou esbaforindo a felicidade de quem conseguiu alcançar o objetivo proposto. Cansado, ele tirou a amarelinha número dez da mochila e a jogou no sofá. Eu não acreditei quando vi a assinatura do Rei Pelé na camisa. Abracei-o feliz e com certa mágoa por saber que só havia uma camisa e certamente era dele. Ele, desvencilhando do meu abraço e retirando da mochila, me deu a amarelinha com o autógrafo de todos os jogadores da seleção de 1982 na frente da camisa e atrás, abaixo do número dez também estava o autógrafo do Pelé:
   - Sabe o que me reconforta, é saber que todo o esforço da minha conquista é para a sua felicidade. Eu te amo, campeão.
   Diante de mim estava um homem que não precisaria morrer e nem da confirmação da igreja para ser intitulado de santo.  Assistimos de mãos dadas todos os jogos do Brasil e pensávamos que iríamos ser tetra campeão quando nas quartas de final, o Brasil caiu diante da França na disputa de pênaltis. Após as penalidades, ele, suavemente, retirou a sua mão da minha, balançou a cabeça, encheu o pulmão de ar e o esbaforiu nervoso, passou as mãos pelos cabelos e me olhando nos olhos falou:
   - O Zico não é Pelé. Não verei o Brasil ser campeão novamente. - O Zico havia perdido um pênalti quando o jogo estava empatado no tempo normal e ele sempre buscava um culpado para o fracasso da seleção brasileira, como também dizia que nunca mais veria o Brasil campeão do mundo.
   Em 1986 eu tive o pior ano da minha vida. Um mês após a final da copa, ele chegou esbaforindo, e antes de entrar à casa, no portão do jardim, observando-o da janela, eu o vi apoiado no portão tentando recuperar o fôlego. Arrastou os pés apoiando-se ora nas plantas, ora em uma esperança de sobreviver, não a dele, mas na minha, pois eu havia corrido em sua direção. Encontrei-o com as duas mãos apoiadas nos joelhos, com os dentes à mostra, esforçando-se em respirar, puxando o ar pelo nariz num esforço descomunal e ao não conseguir abriu a boca, não para pedir socorro, pois não havia mais tempo, mas para ingerir o ar derradeiro. Ele foi ao chão sem ter tempo de pôr a sua mão sobre a minha estendida. Naquele momento tinha percebido que nossas mãos não atariam novamente. Deitei-o no sofá, abri a sua mão gélida e a apertei na minha. Para a minha surpresa ele abriu os olhos, derramou as lágrimas da despedida e balbuciou:
   - Perdoa-a. - A voz rouca saiu enfraquecida.
   Os seus dedos desvencilharam dos meus. O silêncio da morte só foi quebrado pelo meu grito de não. A minha mãe estava encostada na porta da sala sem demonstrar os seus sentimentos, se houvesse algum, provavelmente não seria de dor. Vi nos seus olhos um brilho macabro e gélido, o que isso significava, eu não saberia dizer, nunca soube entender, muito menos compreender o significado do seu olhar. Após o enterro do meu pai, saí do cemitério levando comigo uma tristeza gris, lá fora o tempo estava ensolarado, dando mais brilho às cores. Olhei para trás e fixei os meus olhos nos da minha mãe, eles estavam irrespondíveis, foi a última vez que a vi viva.

   Agora, estava, novamente, no cemitério para dar um endereço ao seu corpo morto, permitindo que ela fosse enterrada no jazido da família.  Era, para mim, um gesto de perdão, não esperei o caixão descer ao túmulo, pedi ao coveiro que depositasse a rosa branca sobre o seu caixão antes de fechar a gaveta. Então ele virou para mim e disse:
   - Lindo gesto.
   Ia sair sem lhe perguntar por que, mas voltei atrás e perguntei.
   - A rosa significa amor. Você deve ter amado ela muito, por isso não quer assistir a cerimônia até o fim.
   Saí sem lhe dar uma resposta, apenas o agradeci. Na rua, apesar do dia gris, trazia em mim as cores da primavera, eu estava colorido e feliz.
    Abri a minha mão e senti a mão do meu pai tocá-la, não o vi próximo a mim, mas tinha certeza que ele me acompanhava.

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11 comentários:

  1. Por que te confundes e te agitas diante dos problemas da vida?
    Deixe que eu cuide de todas as tuas coisas e tudo será melhor.
    Quando você se entregar a mim,
    tudo se resolverá com tranqüilidade segundo meus designos.
    Não te desespere, não me dirija uma oração agitada,
    como se quisesse exigir o cumprimento dos teus desejos.
    Feche os olhos da alma e diga-me com calma:

    Jesus, eu confio em ti.

    Evite preocupações e as angústias
    e os pensamentos sobre o que pode acontecer depois.
    Não bagunce os meus planos, querendo impor suas idéias.
    Deixa-me ser Deus e atuar com liberdade.
    Se abandone confiadamente em mim.
    Repouse em mim e deixe em minhas mãos o teu futuro.
    Diga-me freqüentemente:

    Jesus, eu confio em ti.

    O que mais danos te causa são sua razões,
    sua próprias idéias e você querer resolver as coisas a tua maneira.
    Quando me disser:
    Jesus, eu confio em ti,
    não seja como o paciente que pede ao médico que o cure,
    porque lhe sugere o modo de fazer.
    Deixe se levar em meus braços divinos, não tenha medo,

    EU TE AMO.

    Se acreditar que as coisas pioram
    ou se complicam apesar de tua oração, siga confiando.
    Feche os olhos da alma e confia.
    Continue dizendo a toda hora:

    Jesus, eu confio em ti.

    Necessito das mãos livres para fazer a minha obra.
    Mesmo que a dor seja tão forte,
    a ponto de derramar lágrimas dos seus olhos.
    Estarei com você e com a sua família em todos os momentos.
    Diga:

    Jesus, eu confio em ti.

    Confia só em mim, abandona-se em mim,
    jogue todas as suas angústias e durma tranqüilo.
    Diga-me sempre:

    Jesus, eu confio em ti,

    e verás acontecer grandes milagres.
    Eu te prometo por meu amor.
    Pois, sempre confiarei em você, meu filho...
    _________________________________________


    http://www.youtube.com/watch?v=kxE2WXm5QoY



    Desejamos-lhe dias de paz!


    Blog Yehi Or!
    http://hajalluz.blogspot.com/

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  2. SOU MYRA como ANONIMO!
    maravilha de texto, de sentimentos, voce me emocionou demais!!!!
    como te admiro meu querido amigo Eder!

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  3. Bem legal...sua postagem.

    Te desejo um ótimo final de semana.

    abraços

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  4. Prestando atenção na ideia do conto, na forma de escrever. Me emocionando com o amor deste pai. Tentando imaginar a atitude da mãe, com suas dores, faltas, o amor não expresso, o sentir congelado, preso. A dor e a alegria deste filho, entre o amor imenso do pai e o não sentir amor da mãe.

    E sempre mensagens para refletir, feito o das escolhas.

    beijo.

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  5. ...laços eternos que ngm
    jamais consegue desfazer...

    Eder, vc é fantástico com
    as palavras!

    bjokas, alma linda!

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  6. Nossa que lindo!

    Toda a tristeza que poderia conter essa história, é tragada pelo amor, um amor que torna todo fardo leve e segura a mão eternamente. É assim o amor

    Beijos Eder!

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  7. As surpresas da vida - um "pai" e um "filho" que o destino aproximou. O amor de um pai não biológico, um amor verdadeiro e infinito. É emocionante o texto, Éder! Amei o final, quando sentiu a mão de seu pai- o homem que o acompanhava.

    Gris - um lindo conto.
    É como se estivesse lendo um romance... seus textos são assim. Beijo

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  8. Oi Eder,

    Muito triste, mas recompensado pelo amor vivido entre pai e filho, por esse amor tudo valeu a pena
    E você me enreda em tua escrita.
    Parabéns.
    Beijo meu

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  9. Triste e bonito como a vida é, por isso mesmo teu texto é tocante, Eder.

    Um beijo, parabéns.

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  10. História bonita e triste e muitas vezes real...Bonito este este amor verdadeiro de compaixão pela moça e pela criança.O pai na verdade era um anjo.Existem muitos anjos espalhados pela terra.

    Beijos

    Maria

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  11. Eder,suas histórias são fortes,a mim parecem de certo modo frias,mas talvez seja porque assim mesmo é a vida e um olhar atento consegue perceber melhor que eu,aprendo contigo seja aqui seja nos teus comentários!
    Abraço carinhoso,

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