Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

domingo, 14 de março de 2010

as dores dos outros minhas são


     Ao nascermos nosso contato com os quais convivemos é através da audição e da visão. Os outros sentidos serão adquiridos com o decorrer do tempo. Hoje tenho todos os sentidos aguçados, apesar, por uma herança genética, a minha visão não ser boa, pois tenho quatro graus de miopia. Sem lentes de correção as imagens são disformes. Nesta semana o que eu vi me chocou e causou indignação. Ilhada por barracas de camelô, Santo Amaro é caminho para o meu trabalho. Passava por uma dessas ruas onde proliferam as barracas, vejo alguém com um pedaço de pau na mão, aproximo e ele desfere várias pauladas num indigente que dormia entre as barracas, exigindo que ele acordasse, pois o dono da mesma estava para chegar. Senti desprezo pela atitude daquele homem. Pensei que já tinha visto tudo. Esperando o ônibus no ponto, outro camelô arma sua barraca quando um deficiente mental o perturba, ele educadamente pede que ele se afaste e, quando surgindo não sei de onde, alguém com um cabo de vassoura desferindo várias pauladas no deficiente mental, empurra-o e (a cena mais brutal) cutuca-o no fígado, no baço e na altura do pulmão com o cabo de vassoura. Ele urra de dor, da volta em si mesmo, coloca a língua para fora e se afasta girando cento e oitenta graus até cair no chão. Dou um passo adiante para interferir naquela cena, mas o bom senso ou o medo me retém. Pode parecer inverossímil, mas é a mais pura verdade. Noutro dia da semana de volta para casa, esperando o ônibus no ponto final próximo ao Terminal Santo Amaro, vejo outro deficiente mental trajando roupa de Papai Noel parar numa barraca que vende salgadinhos e bebidas, aproxima e furta um salgado e corre. O dono da barraca corre atrás dele e lhe dá uma rasteira, no chão desfere vários chutes nele e lhe toma o salgadinho jogando-o no lixo. Chega sexta-feira e no mesmo ponto de ônibus um mendigo com um real na mão tenta comprar um salgadinho, o dono pega uma vassoura e o enxota dali. Ele vai até o carrinho de pipoca e tenta comprar um saco de pipoca, mas o pipoqueiro também o enxota dali. Ele atravessa a rua, senta no passeio e ali fica até eu embarcar no ônibus.
     São cenas como esta que faz com que eu penso que as lentes de contato são um fardo para mim, mostra-me realmente como o ser humano é destrutivo. São cenas como estas que mostra como somos péssimos atores. 



                             02/07/06