Eu rabisco o sol que a chuva apagou/Quero que saibas que me lembro/Queria até que pudesses me ver/És parte ainda do que me faz forte/E, pra ser honesto,/Só um pouquinho infeliz... - Legião Urbana.
Ao pousar próximo da casa branca com portas
amarelas, Hesediel desatou a cinta de proteção desprendendo Ariadna do seu
corpo e sentiu o odor sulfúreo. Sabendo que anjos Shaitans estavam próximo
devido ao cheiro, Hesediel a puxou de volta para próximo de si e sacou da sua
espada Divus. O que Hesediel não via era que os anjos Shaitans não foram
atraídos por ele, mas pela beleza de Ariadna, e assim que eles a olhavam nos
olhos, transformavam-se em estátua de sal para logo em seguida se esfacelarem
em pó. Aos poucos todos se vergaram à sua beleza em uma espécie de êxtase
coletivo. Furiosus, longe dos olhos de todos e sobrevoando sob o céu iluminado,
sem mais o manto negro a cobri-lo, pois todos os anjos Shaitans havia virado pó,
observava Hesediel e Ariadna. Agora, entendendo o porquê de Iratus ter virado
estátua de sal, ele colocou uma venda em seus olhos, voou rente ao chão,
desviou da espada de Hesediel jogada a esmo e com as garras dos pés capturou
Ariadna pousando-a em um gancho de um dos prédios mais alto.
Sua respiração ofegante desejava vingança,
contudo, ao cheirá-la, os seus desejos já eram outros, não obstante, ele sabia
que o Senhor das Trevas a queria também. Furiosus retirou a venda e a colocou
em Ariadna atando fortemente. O vento desnudava Ariadna, a sua pele alva
refletida pelo sol causava fascínio em Furiosus. Ele se aproximou de Ariadna e
sentiu o calor do seu corpo transpassando pelos seus poros como gotículas de
água que ao estourarem, deixavam no ar um aroma refrescante e suave. Arrebatado
pela concupiscência, Furiosus, com as garras dos seus pés sobre o corpo de
Ariadna arrancou as suas peças íntimas. Apesar de não ter conhecimento sobre
geometria, desenho artístico, poesia e mais precisamente de como o artista se
inspira para no barro moldar o sentido de perfeição, Furiosus ficou tão
bestificado diante de tanta beleza que descontrolado passou a língua entre os
dois seios de Ariadna sugando os seus mamilos em seguida, depois desceu a
língua até o vórtice do seu sexo preparando para consumar os seus desejos.
Ariadna confundia-se entre a repugnância e o prazer, sem saber se pedia para
parar ou continuar, contudo, ele parou, não por que ela o pediu. Furiosus
afastou-se perturbado, olhou as curvas de Ariadna e sobre o efeito delas não
percebeu Hesediel aproximando-se com a espada em punhos. Quando ele ia
retirá-la do gancho para mentalizar a forma humana e no chão consumar os seus
desejos, sentiu o golpe de espada nas costas.
A cegueira impediu que o golpe de Hesediel
fosse certeiro e arrancasse as asas de Furiosus. Mesmos com dores, Furiosus soergueu,
empunhou a espada, fechou as asas e, tresloucado, foi em direção a Hesediel.
Sentido que não havia arrancado as asas de Furiosus, Hesediel sabia que só
teria aquela oportunidade e como a desperdiçou, desejava morrer vendo a sua
amada, Ariadna, mesmo sabendo que seria a primeira e última vez. Furiosus não
tinha a honra dos grandes guerreiros, nenhum anjo Shaitan a tinha, tampouco,
sabia reconhecer o derrotado para lhe dar uma boa morte. Ele cravou,
covardemente, a espada nas costas de Hesediel, perfurando o seu coração, assim,
sabia que a dor só encerraria com a morte do seu espírito. A violência do golpe
foi tão desproporcional que os dois desceram vertiginosamente, e ao cair no solo,
cada um foi para um lado, rolando sem destino. Hesediel ficou preso pela espada
cravejada no seu corpo e presa no chão. Furiosus, com o corpo dolorido,
estatelou-se entre os mortos que serviam de banquete para urubus.
A maior desonra para um anjo é ser morto por
um humano ou por outro anjo transmutado em humano. Hesediel sabia o que lhe
aguardava e não tinha força para lutar contra. Furiosus levantou pisando nos
corpos dos mortos a procura de Hesediel. Quando o achou, cerrou os olhos,
mentalizou a forma humana, acelerou os passos, e, transmutado, o pisou no
pescoço, arrancou a sua espada Daemo, ergueu as asas de Hesediel e as cortou
violentamente. Lestamente, Furiosus mentalizou a forma angelical, e,
transmutado, sacou a sua pistola e descarregou o pente atirando a esmo, ele
sabia que uma das balas acharia o espírito de Hesediel.
Desmaterializado, Hesediel levitou ao
encontro de Ariadna, presa no gancho de um dos prédios. As balas zuniam no ar,
algumas ricocheteavam nos prédios, capturavam alguns espíritos desgarrados e
explodiam em seguida, outras procuravam o espírito de Hesediel. Os desejos
impulsionavam cada vez mais o espírito de Hesediel aos braços de Ariadna, e,
finalmente, quando o espaço entre os dois não deixava brecha para um fio de cabelo
passar, o ar em torno dos dois se tornou gélido. O frio começou a petrificar o
corpo de Ariadna quebrando o clímax, o estremecimento da sua espinha fez com
que o espírito de Hesediel se afastasse, atentando para os seus atos.
Os desejos em si não nos levam ao pecado,
mas o controle sobre os mesmos sim, e são as escolhas, em recusá-los ou
consumá-los que se conhece o pecador. O salvamento pode vir pelo
arrependimento, e, dependendo do julgador, redundará em condenação ou não.
Arrependido, Hesediel orou, não que
buscasse um salvamento para si, mas porque ele agiu contra os seus princípios
cristãos, o de amar sem apego ao físico.
Ariadna começou a sentir tremores pelo
corpo, os seus dentes batiam um nos outros descontroladamente, os dedos das
mãos e dos pés arroxeavam, antes que a sonolência lhe tirasse qualquer
possibilidade de pedir ajuda, ela gritou socorro desesperadamente. Quando a
ajuda veio, ela adormecia com as pupilas dilatadas.
O espírito de Hesediel sabia que se
intensificasse a sua luz, seria achado pelas balas, porém, tinha a certeza que
a sensação de frio que Ariadna estava sentindo foi provocada por ele a ter
desejado fisicamente. Os deuses a estavam castigando para atingi-lo.
O céu foi tomado por um clarão inaudito, a
luminosidade se expandiu e contraiu atraindo as balas. Na contração, Hesediel
levantou os braços de Ariadna aquecendo as suas axilas, depois as pernas e
braços, e por fim abraçou-a soltando-a assim que ela se refez. Ele já notara
que a claridade irradiada pelo seu corpo ativou o sistema de busca das balas
atirada por Furiosus, por isso afastou de Ariadna assim que ela se recuperou.
As balas fizeram um circulo em volta do
espírito de Hesediel, abriram suas pontas soltando tentáculos escuros que o
envolveu e travaram uma disputa para ver quem o tinha para si. Algumas
esmoreceram, desistiram e foram atrás de outros espíritos desgarrados; outras
apagaram seus tentáculos e perderam o seu poder de captura, pois o espírito de
Hesediel ainda tinha um pouco de luz e resistia. Enfim, quando restava apenas
uma bala, Hesediel sabendo que sairia derrotado, se entregou. Os tentáculos
escuros arrastou o espírito de Hesediel para dentro de si, fechou a sua
abertura e se explodiu. A luminosidade que se via no céu era maior que a do
espírito de Hesediel quando se expandiu e se contraiu, porém, foi perdendo a
sua intensidade rapidamente tal qual a vela bruxuleando no castiçal que aos
poucos se apaga devido o pavio estar chegando ao fim.
Como os anjos Shaitans não expressam a sua alegria
com sorrisos, Furiosus, ao ver um pequeno ponto de luz no céu após a explosão,
abriu as suas asas, bateu no peito várias vezes e urrou de felicidade, pois
sabia que o espírito de Hesediel havia morrido. Ariadna, refeita da hipotermia,
teve tremores no corpo ao ouvir os urros, e o pavor foi ainda maior quando
sentiu as garras de Furiosus retirá-la do gancho. Furiosus voou alto, deu a
volta em torno do prédio, embicou em direção a espada Divus de Hesediel,
pegou-a do chão com as garras da mão direita e voou para cima dando voltas no
prédio, novamente. A satisfação de ter a espada como prêmio pela vitória foi demonstrada
com vários urros ensurdecedora. O grito de pavor de Ariadna por Furiosus passar
rente aos objetos projetando seu corpo em direção aos mesmos, não se fez
audível por ter sido abafado pelos urros. Furiosus, carregando em pleno voo a
arma com um novo pente com balas de captura de espíritos, voou em direção à
casa branca com portas amarelas onde se encontravam o Senhor das Trevas e
Lucius.
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