Na vida como na
morte a mentira e a verdade são ligadas por uma linha imaginária, que
dependendo da tua crença faz você pender, ou, então mais precisamente, usando a
palavra certa, crer em uma ou na outra, assim o que parece ser uma mentira pode
ser verdade e vice-versa. Sabendo disso de antemão, é sabido, havido e tido que
o homem descende do barro, ou seja, foi forjado no barro. Crido, o mito se
tornou verdade, mas há aqueles que crêem que o homem evolui do macaco. Caído do
galho o macaco se atolou na lama e em passos curtos se transformou em homem.
Desmancha-se o barro para a ciência criar o seu mito. Mas permanece uma
interrogação: e o macaco de que foi feito? Como todo ser vivente que habita a
terra, o macaco foi feito do barro, portanto entre o homem e o macaco a única
semelhança é a do material utilizado para sua forja, com um pequeno detalhe, de
todos os habitantes da terra, apenas, isso mesmo, apenas o homem teve seu
feitio de um barro diferente.
Se você que me
ler conseguir desvestir de suas crenças, desfazer dos dogmas incrustados em seu
subconsciente, destrancar os cadeados das correntes que o prende a sua fé, seja
ela qual for, continue a leitura, se não, pare por aqui. Foi preciso enfiar a
mão na massa, melhor dizendo, no barro para em linhas tortas o verbo vir à luz.
Estamos no
sexto dia da criação, o chão como o céu, o sol como a lua, as estrelas como
todos os astros, enfim, o universo como o conhecemos tinha sido criado do mesmo
barro. O Oleiro com as mãos sujas e ressecadas descansava do trabalho árduo, e,
se assim permanecesse, teria percebido o quanto de perfeição havia na sua
criação. Os animais saltitando por entre plantas frondosas, os pássaros a se
enamorarem no ar, os peixes a darem cambalhotas nos rios e mares. O mundo
estava encharcado da essência divina. Desperto, o Oleiro percebeu que precisava
criar o Ser para preservar e cuidar do seu mundo, mas para isso havia a
necessidade de que ele fosse feito de outro barro, diferente do que havia
utilizado para dar vida a tudo que existia até aquele momento, e que sua alma
fosse feita da lama Onamusanatas retirada de todos os seres vivos existente,
assim o Ser feito a sua semelhança e a semelhança de tudo que até aquele
momento existia, seria amante e preservador do que havia entre o céu e a terra.
Mas o Oleiro não percebeu que quando ele retirava a lama Onamusanatas ela era
retirada com dor, e tudo que assim é feito vem acompanhado da maldade, motivo
de todos os males. O Oleiro com o barro diferente em mãos o amassou até ele
tomar consistência e ficar homogêneo. Após muito suor e esforço ele conseguiu
moldar o Ser como ele havia imaginado, à sua semelhança. Agora com a lama Onamusanatas
ele ia dar vida ao Ser à semelhança de tudo existido. Começou passando a lama
abaixo da testa, do lado esquerdo e depois do lado direito, fez-se os olhos. O
Ser ficou maravilhado diante de tanta beleza. A lama Onamusanatas agora foi
passada nas laterais da sua cabeça, fez-se os ouvido e o Ser maravilhou-se com
a sinfonia dos pássaros. A lama foi passada abaixo dos olhos, fez-se o nariz e
ele sentiu o frescor das marés. Passou-a agora abaixo do nariz, fez-se a boca e
o Ser disse suas primeiras palavras: “Isso aqui será meu, por ter a essência
divina, Deus sou, e tudo que é dele meu é”. Aquelas palavras assustaram o
Oleiro, e ele não injetou a lama Onamusanatas no penduricalho que havia entre
as pernas do Ser para que ele não pudesse frutificar, apenas a enfiou no lado
oposto com o dedo médio de tal forma que o Ser gritou de dor. E assim com todas
as coisas colocadas no seu devido lugar o Ser foi criado. Após o feito, o
Oleiro percebeu que o feitio, ou seja, o Ser havia recebido a lama da dor,
assim sendo, a lama da maldade, ao contrario do que ele pensava, a lama da
bondade. Por isso o que seria o Ser Onamusanatas, o Ser do bem que seria amante
e preservador do que havia entre o céu e a terra, passou a ser o seu contrário.
Estava criado o Satanasumano.
Se o Oleiro
tivesse destruído o Ser o mundo estaria em perfeita harmonia com toda a
essência divina e por si só livre de qualquer maldade, mas como só existia o
bem nas atitudes do Oleiro, nada haveria de movê-lo em sentido contrário. Por
isso ele voltou para os braços do divino e teve o seu descanso eterno. Como o
Diabo perscruta por detrás das portas e está sempre aposto para interferir, não
tendo descanso em dias úteis, santos ou feriados, apesar de que alguns acham
que ele só trabalha no feriado de carnaval, em bailes funks e em raves, e como
o dito cujo não tinha conhecimento de feriado porque no começo do mundo todos
os dias eram úteis por serem dias divinos; não havia dias santos por santo
ainda não haver porque o único humano para santificar era o Ser e ele estava
mais para o demônio do que para santo; e como bailes funks e raves não havia
porque a mulher não tinha sido inventada, o Diabo veio para modificar o Ser.
Satanasumano
estava triste por solitário ser, e todo ser solitário deixa a mente aberta para
o Diabo entrar. Estava triste, também, por função nenhuma ter o que ele
carregava por entre as pernas, o seu penduricalho. Estamos no sétimo dia da
criação, e o Oleiro descansava tal qual
baianos em todos os dias da semana, ou cariocas em todos os dias do ano,
enquanto o Diabo trabalhava tal qual os paulistas. E não é à-toa que hoje São
Paulo é o inferno que é. Posto isto apenas para criar polêmica, e desagradar a
paulistas, cariocas, baianos e troianos, volto ao enredo original. Como a
palavra “ser” pode ser tanto masculina como feminina, o Ser a partir de agora
será chamado Adão.
O Diabo chegou
até Adão e lhe propôs a criação de um Ser feminino, que chamaremos de Eva,
prometendo que ela daria uso ao seu penduricalho e que ele injetaria a lama Onamusanatas
pelo mesmo para assim frutificarem. Adão quis saber o que ele quereria em troca, e o Diabo lhe
respondeu que quereria que ele frutificasse, pois os seus descendentes fariam o
seu trabalho, no caso o do Diabo, ameno, assim ele, o Diabo, descansaria para
sempre tal qual o Oleiro. Proposta aceita, o Diabo pôs a lama Onamusanatas na
boca e a soprou pelo penduricalho de Adão e depois a sugou, e ficaria assim até
o fim dos dias para prazer dos dois, se o Diabo não tivesse de inventar a
mulher para melhor uso Adão dar ao seu penduricalho. Após várias injeções e
sugações o penduricalho de Adão, erectus, soltou de volta a lama, fez-se a
semínula. O Diabo, usando do mesmo barro que Adão foi feito, fez a mulher à
semelhança de Adão, e a fez de uma forma tão grotesca. Mas afinal o Diabo é um
excelente artesão das almas e não do corpo, pois a expressão “ela está com o
diabo no corpo” advém deste fato. O
Diabo usando do resto da lama Onamusanatas fez olhos, ouvidos, nariz e boca ao
mesmo tempo, para tempo não perder. Assim que a boca de Eva foi feita ela bateu
com a língua nos dentes e deitou a falar criticando a obra do Diabo, ou seja,
ela própria. Desse jeito vou ter que fazer o diabo para atrair Adão, vou ter
que fazer mundos e fundos sem ter fundo e o mundo já havia sido criado tão
perfeito que eu perto do mundo estou mais é no fundo do poço, e blá-blá-blá-blá.
Assim falou Eva que o Diabo não agüentou e deu no pé deixando para Adão
finalizar a obra. E Eva falou tanto durante tantos dias que Adão pensou em dar
fim na língua dela, mas achou por bem não por achar que aquele órgão teria
alguma utilidade além da fala. Eva perturbou tanto o espírito de Adão ao ponto
dele não aguentar mais e por os adereços que ela tanto pedia. Primeiro ele pôs
dois montes na altura do tórax, fez-se os seios; depois dois montes abaixo da
última vértebra, fez-se a bunda. E por último lhe abriu uma fenda por entre as
pernas. Terminado, Eva vira para Adão e lhe diz que lhe faltava algo. Adão
intrigado, achando que estava perfeito, pergunta o que era. Um espelho,
respondeu Eva.
Deus,
percebendo que isto não terminaria bem, desceu e apontado para Eva, falou para
Adão: “Não coma deste fruto, pois será a sua perdição”. Adão assim obedeceu e
por um longo tempo viveu em completa
harmonia com Eva. Como o Diabo pode vir de várias formas, veio, por entre as
pernas de Adão, disfarçado de cobra. E dia após dia a cobra lhe atentou tanto
que Adão sucumbiu ao pecado. Assim Adão e Eva espalharam a lama, fruto da dor e
motivo para toda a maldade, por toda a sua descendência, e cabe a nós limparmos
esta lama para nos purificarmos, pois o
barro que Adão e Eva foram feitos foi dado por Deus ao Oleiro, e se somos à
semelhança de Deus por fora, cabe a nós sermos também por dentro.
Texto de 2008