O caminho estava
enlameado, aqui e ali se via alguns destroços da última grande guerra, a
natureza relutava em reviver, algumas gramíneas ressurgiam entre os escombros.
Quando, enfim, ele se viu diante do portão da Horda abandonada, a destruição do
local fez surgir a desesperança e por um instante ele se perguntou se valia a
pena arriscar a sua vida para salvar uma raça que ao longo da sua própria
história foi mais maligna do que a criatura que iria enfrentar. Não se deixou
levar pelos pensamentos e se encaminhou para a Igreja.
O fogo havia destruído todo telhado, as
paredes enegrecidas pela fuligem do incêndio se mantinham de pé, porém, com a
metade do seu tamanho original. Próbolo não acreditou quando viu o crucifixo
com a figura de Cristo intacto. Não se espantou quando passou as mãos pelos
cravos e os sentiu úmidos, provavelmente devido à neve derretida, porém, ao
olhar suas mãos e vê-las impregnadas com um líquido pastoso e avermelhado, ele
deu um pulo para trás. Ao levar um dos dedos das mãos à boca, não se sabe se
impressionado com o que vira, ele sentiu o gosto de sangue. As surpresas lhe
foram demais, cambaleando, foi ao chão. Quando o seu corpo ia ao chão, viu uma
sombra gigantesca se avolumar em uma das paredes da Igreja. Ao bater a cabeça
em uma peça dura dos escombros, ele desmaiou.
O túnel levara o Demo à Igreja. Chegando lá,
diante do crucifixo, ele se perguntou por que aquela raça adorava e idolatrava
a imagem daquele homem pregado na cruz. Passou as mãos pelos cravos e sentiu
que o tempo havia imposto o seu domínio sobre os mesmos, a ferrugem escorria,
após o derretimento da neve, entre a madeira e os furos nas mãos e pés da
imagem entalhada. Fungando o ar, ele sentiu o cheiro que guardou na sua mente
durante esses vinte e cinco anos. Perscrutou o olhar para a direção de onde
estava vindo o aroma. Diante de si, a imagem de alguém desmaiado, com um
pequeno detalhe, uma tira de pano grená amarrando os seus longos cabelos. Com o
aroma vindo daquela tira, não teve dúvidas, era ela.
Recobrado, Próbolo não mais se viu diante do
Cristo, mas do Demo. Assim que o Demo percebeu que não era uma mulher, mas um
homem, filho da sua presa, ele sorriu, pois o seu intento, a vingança, seria
mais valiosa por saber que a luta se daria entre dois machos. O gosto do sangue
que ele iria derramar não teria o gosto da vingança, doce, e nem a sua
temperatura, fria, mas, amarga e quente. O sangue seria derramado.
Ao levantar-se, Próbolo ia partir para cima
da criatura, mas a sua voz interna o havia alertado para não se deixar levar
pelo ódio. Outra voz o alertou que ali não era lugar para lutas, pois ele
estava em solo sagrado.
Ao encaminhar-se para fora correndo, Próbolo
provocou no Demo uma satisfação extremada, pois ele pensou que era o medo o
combustível da sua correria. O Demo, a passos largos, alcançou a rua no momento
que Próbolo parou esperando o ataque. Os dois se olharam, Próbolo tentando
antever o ataque, o Demo procurando o medo no inimigo. Não o viu, porém, um
sentimento maior o levaria ao seu intento, a vingança. Flexionando os joelhos,
ele saltou por cima de Próbolo e ao aterrissar no chão, atrás dele, ceifou com
as garras o seu rabo de cavalo levando-o ao nariz. O aroma impregnado na tira
de pano grená o levou ao delírio e depois a satisfação. Preparou o golpe final
flexionando uma das pernas para prender Próbolo no chão com as garras dos pés.
Próbolo não sabia como reagir, surpreendido e ainda abalado pelo golpe,
divisava a morte nas garras do inimigo. Então, sem saber quem lhe falava, ouviu
uma voz lhe pedir para ter fé Naquele que tudo pode, entrecortado por outra voz
lhe ciciando aos ouvidos que o ponto fraco do inimigo estava nas articulações.
O Demo se preparava para fincar as garras
dos pés no chão, prendendo uma das pernas de Próbolo, quando foi surpreendido
pela sua reação. Próbolo rolou no chão e ao mesmo tempo em que flexionava o
tórax e o joelho, retirou o punhal da bainha presa na perna direita e o cravou
no joelho da criatura. O Demo desabou no chão procurando o inimigo com os
olhos. Quando o viu, tentou uma reação, contudo, ele não a teria. Próbolo,
usando os pés, flexionou a cabeça da criatura para trás e enfiou a espada de
cima para baixo. O Demo sentiu o fio frio da espada lhe rasgar as entranhas e
quando atingiu o seu coração, o gosto amargo da derrota lhe chegou à boca
avisando-lhe o seu fim.
Próbolo não se sentiu vitorioso,
internamente, aquela morte não o satisfazia, apesar de saber que não tinha
outra opção. Encaminhou-se à Igreja e ajoelhado diante da imagem entalhada do
Cristo pediu perdão.
A ferrugem terminou o seu processo de
deterioração sobre os cravos e levou a imagem entalhada do Cristo ao chão,
quebrando-a. Assustado, Próbolo deu um pulo para trás tropeçando nas lascas de
madeira projetadas e caiu. Ao se levantar, viu diante de si a Bíblia que fora
da sua mãe aberta nas cartas de Paulo aos Coríntios.
O sol estampava no céu a sua luz iluminando
a terra como nunca havia iluminado antes. Com a Bíblia em mãos, Próbolo sabia
que o seu caminho não seria mais o mesmo, pois a Palavra, além de lhe trazer
mais luz, ia trazer a terra também. Um longo período de
iluminação se iniciava.
Imagem clique AQUI
Com alegria leio a última pagina desta história. Cada página um ensinamento, riqueza de imagens, de situações. Parabénssss!! Bjs
ResponderExcluirBom, esse final não me surpreendeu, já o esperava uma vez que a lei da natureza reza que o bem vence o mal.. correto? Porque Coríntios? Gostei dessa história talvez porque tenha me identificado nela. Na realidade uma diferença bem relevante me mantém distante do Proby, mas isso já é uma outra história... Belo final Éd! Gr. Bj.!
ResponderExcluirja sabe como penso, que voce escreve de maravilha, mas tbme assusta:))))
ResponderExcluirbeijos
Que final bonito,Eder!Esperança!Uma luta entre o bem e o mal,história de tristezas e perdas,muito forte( lembra o Exterminador do futuro!...rss..) mas amei o final que encontrou!Parabens!bjs e boa quinta!
ResponderExcluirDepois de tantas perseguições, inquietações , medos e torturas , eis que houve grande luz, a luz que trazia a salvação, o sol, a libertação e as certezas de que a vitória estaria em suas mãos...lindamente venceu porque acreditou na verdade , na palavra e no todo poderoso...
ResponderExcluirBeijos
Preciso dizer que encerrou com chave de ouro, Eder? Claro que não. Já aguardo a próxima saga e uma nova trama! Abraços!
ResponderExcluirA sua prosa é muito intensa. As aventuras de Próbolo são fantásticas e a iluminação anunciada neste último parágrafo é a mostra de que a história foi bem contada e bem encerrada. Parabéns!
ResponderExcluirEder, que maravilha esse final, e repito o que disse: digno do roteiro de um filme! Parabéns pela história. Para a fé nada é impossível, às vezes somos obrigados a fazer coisas que não gostaríamos, mas quando escolhemos a luz, nunca ficamos completamente no escuro. UM abraço!
ResponderExcluirE a nova história? Tá demorando hein? Dava pra ser assim de amor ao invés de terror? rsrsr brincadeira! Seja lá qual for acompanharei! Gr. Bj.!
ResponderExcluirÉder,um final digno de best-seller,parabéns pelo conteúdo criado a partir da sua imaginação que repito, é muito fértil para sozinho pensar em tudo isso.Gostei muito porque deixou de lado o pessimismo e pontuou que há sempre uma luz a se buscar apesar de tudo!
ResponderExcluirGrande abraço,na certeza de que outros textos ricos como este virão!
Eder, parabéns pela construção dessa incrível história!
ResponderExcluirCom as palavras nas mãos, o caminho jamais será o mesmo...
Muito bonito, meu amigo, de verdade!