Fauser
levantou-se da cama, abriu a porta e espreitou pela fresta. O corpo da babá
fulgia e de sua mão pendia uma varinha de condão. Minha fada madrinha! Fauser
pensou alto. Voltou para a cama e adormeceu.
Mas
essa noite não era como as outras. Após poucos minutos de sono, um barulho
diferente fez com que Fauser acordasse. Ainda esfregando seus pequenos olhinhos
com sono, foi à janela, e, arregalando os seus olhos de jabuticaba além da
grade de proteção, não acreditou no que estava vendo.
Uma
formiga levantava a porta da garagem!
A
formiga, amiga de infância de Cacau, estava atarefada. O Senhor do tempo havia
a encarregado de buscar uma solução para vida sem amor que Cacau e Mel
estavam levando. Mas, para isso, era preciso que forças fossem unidas. A
formiga precisava encontrar os três objetos inanimados que mais amavam àqueles
dois cabeças-duras! E, na garagem da casa, achou a bola de capotão
descosturada numa caixa de sapato, a bola de gude como olhos de uma das bonecas
de Mel e a bicicleta entre os ferros velhos.
-
Que desperdício! Mas, não há tempo para lamentações! O portal não abre muitas
vezes e ainda há muito que fazer! O que vocês estão precisando é de água para
encantarem. E, conforme ia dizendo essas palavras, as três receberam os
esguichos de água vindos da mangueira do jardim.
O
encanto começava a fazer efeito. Sacudindo-se tal qual cachorro, a bicicleta
reviveu; a bola de capotão, apesar de descosturada, espirrou dando sinal de
vida; e a bola de gude saltou do olho da boneca e saiu rolando pela grama
molhada, deixando um rastro de alegria.
As
três disseram em uníssono:
-
Você voltou!!!
-
Sim, sim, mas não temos tempo, aliás, temos o tempo que o Senhor do tempo nos
concedeu. E é pouco, muito pouco, mas pode operar milagres na vida dessa
família. E pensar que Cacau e Mel eram tão atenciosos com vocês! Tsc, tsc,
tsc... Tínhamos certeza de que seriam bons pais. Agora vocês me respondam, onde
foi que eles erraram e entraram nesse caminho sem vida, sem alma?
A
bola de gude, desde sempre a mais falante, e de longe a mais pessimista, fez um
relato breve, sempre é claro, do seu ponto de vista:
-
Mas ora essa, dona formiga, eu disse que os dois iriam nos esquecer. Essas
coisas de homem e mulher atrapalham muito o discernimento das pessoas. Pois se
acreditam, com toda a força, que para ser grande é preciso esquecer-se de
quando era pequeno! E eu agora é que lhes pergunto: como eles podem criar uma
criança se perderam sua essência?
A
bicicleta, sempre suave e gentil, tão magoada que estava, resolveu participar
também da conferência:
-
Veja só, dona formiga, se é possível tal estapafúrdio: Eu aqui, linda, girassóis
grafitados e azul da cor do céu, e eles comprando coisas que precisam ficar
presas na parede! Fauser NUNCA nos viu! Acho mesmo que (agora ela está sussurrando,
pois detesta fazer fofoca) jamais andou num selim de bicicleta!
A
indignação foi geral. Um festival de "assim não dá", "isso
precisa acabar", foi ouvido, até que, numa surpresa danada, a bola de
capotão pede a palavra:
- Eu
fui presenteado a Cacau no mesmo dia em que ele conheceu a Mel. Pude ver em
seus olhos o amor brotando. E o amor é o gesto sublime que eleva os seres
humanos. A vida, no entanto, os engoliu. Na máquina que, hoje, gira o mundo,
não há mais tempo para ser feliz - a menos que esse artigo esteja à venda em
uma prateleira, perto dos aparelhos eletrônicos.
E,
esses subterfúgios escondem a triste realidade desse casal que, outrora, era
criança: eles desaprenderam a amar. Esqueceram-se que é o sentimento mais
completo, e, no entanto o mais simples de se dividir.
Continua quarta-feira às18hs00min
TEXTO DE ÁGUA E ÓLEO MISTURADOS
AUTORES:
Água: Déia Tolda
Oi Éder,
ResponderExcluirEstou adorando, e assim é a vida na sua quase totalidade...
Beijos
Lua singular
Oi Eder
ResponderExcluirQue lindo está o seu jardim com tão belas flores ornando-o.
Tenho perdido muita coisa por aqui, mas nunca o caminho que me traz de volta.
Beijos
Também pergunto-me, Eder, em que ponto deixamos nos escapar nossa essência infantil, nossa capacidade de valorizar o simples. Penso que uma das grandes lições a ser realizada a vida toda é perceber várias vezes o momento da entrega e o momento do resgate. Gosto do diálogo surreal. Um abraço aos dois!
ResponderExcluirAinda há esperança pra essa família, né? Gostei dessa pequena revolução que certamente resultará na redescoberta do amor e de como ele precisa ser cuidado pra não ficar jogado num canto.
ResponderExcluirBeijo, arigó.
Olá!Boa noite
ResponderExcluirÉder
Déia
e no meio do festival de "assim não dá", "isso precisa acabar", todos tem um pontinho de razão, à seu modo de pensar, naturalmente...e embora a distinção seja mais simples em palavras do que na vida real, sugere espectro dentro do qual todos podem se posicionar: Lembrar se que muitas vezes nossas escolhas estão relacionadas à maneira que aprendemos e sentimos o amor na infância e pelo modelo de relacionamento que vivenciamos de nossos pais...por isso vejo esperança e assim, espero que Mel e Cacau , tranquilizando-os que não serão abandonados (bola, bicicleta, bolinha e Fauser)e nem deixarão de serem amados, que precisam de tempo para adaptarem-se com a nova situação....
Aguardando a próxima
Agradecido
bela semana
Abraços
o amor vai voltar...a formiguinha esta ajudando e Fauser vai ser FELIZ!!!
ResponderExcluiradoro sta historia!
bjos
É preciso sempre cultivar a criança que existe dentro de nós.
ResponderExcluirQue o encanto volte para essa família e para o restante do mundo. Perder a infância é muito triste. É não ter história para contar. Muito bem! :)
ResponderExcluir"Pois se acreditam, com toda a força, que para ser grande é preciso esquecer-se de quando era pequeno! E eu agora é que lhes pergunto: como eles podem criar uma criança se perderam sua essência?" Adorei... este conto está nos abrindo os olhos cada dia mais da importância de não nos deixarmos levar pela dureza do mundo... parabéns! Aguardo a continuação... :)
ResponderExcluirNem tudo está perdido e que bom! Aliás, é forte isso: "desaprender a amar". Mas muito real, infelizmente. Abraços!
ResponderExcluirOi Éder,bom dia!
ResponderExcluirRelendo as partes anteriores do conto e assim pegando o fio da meada desta história familiar Acredito que possa haver uma reviravolta nestes personagens adultos fazendo-os perceber o quanto estão perdendo da beleza de viver a infância do próprio filho e reviver assim também a deles.
Toda essa modernidade tecnológica em que vivemos de certa forma contribuiu e contribui para um afastamento das coisas simples da vida na infância. Muitas crianças hoje sequer sabem o que é uma bolinha de gude, um jogo de fincas, construir com latinhas uma cisterna no quintal, um balanço de pneu... enfim, criar brinquedos quando não se tem. Somos levados cada vez mais a consumir felicidade de prateleira e ela é cada vez mais descartável. Triste isso...
ResponderExcluirEstou apaixonada pela estória! Gr. BJ.!
Olá!Boa tarde
ResponderExcluirÉder
agradecendo pelo carinho da visita!Obrigado!
Bela semana!
Abraços!
A magia está voltando. E ela reside nos sonhos que abandonamos. Objetos que foram sinônimo de alegria estão adquirindo vida e, certamente, contribuirão para a volta do amor a esse lar. Abraço.
ResponderExcluirNossa que lindo.
ResponderExcluirE podemos refletir tanto sobre esse pedacinho!
Espero que o encanto volte para eles! Beijos!
OI EDER E DÉIA!
ResponderExcluirENQUANTO PERMANECER EM NÓS ESTA ESSÊNCIA DE QUE FALAM, A DA CRIANÇA, NUNCA PERDEREMOS O QUE TEMOS DE MELHOR PARA PASSAR A NOSSOS FILHOS.
MUITO BONITO.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/