A maldade é fruto da incapacidade humana de aceitar o outro. Qual de nós, em busca da felicidade, a alcançou fazendo o outro feliz? Qual de nós plantou a semente da alegria em um coração que não fosse o nosso?
Ele não teve a oportunidade de fazê-la feliz, o suficiente. Agora, a felicidade residia aonde o sol se esconde; por mais que a procurasse, ele nunca a encontraria. A bala alojada em seu intestino não era impedimento para tanto, era preciso muito mais do que força física para se chegar lá. Tendo a morte como passaporte certo, ele estava tão próximo disso.
Seus pais, sogro e sogra; tios, tias, cunhados e cunhadas; irmãs, irmãos, sobrinhos e sobrinhas; padrinhos, madrinhas, alguns amigos e amigas; o padre e alguns desconhecidos que estavam na igreja para assistir a celebração do seu casamento; e, finalmente, a sua noiva; todos mortos. Algumas pessoas se arrastavam sobre os corpos mortos caídos no chão; assustadas, sem conseguir desviar das poças de sangue, preocupavam-se em se desviar das balas que zuniam sobre os seus corpos. Fora da igreja, o cenário era de guerra; o Caveirão estava sendo crivado de balas; o morro, campo de batalha aonde inocentes ou não tinham um único destino, a morte, vivia mais um começo de noite, onde polícia e bandido não escolhia a quem abater. Houve um tempo que o morro sabia quem era o mocinho e quem era o bandido.
Naquele momento não importava qual mão havia os matado, pois a sociedade não sabe mais dos seus heróis. Qual de nós, por menor que seja a atitude, por desprezo a dor do outro, ou por júbilo a esta mesma dor, também, não tem as mãos manchadas pelo sangue que são derramados, tanto no morro como no asfalto?
A raiva não lhe permitiu as lágrimas. Seus olhos se moviam, intermitentes, em meio ao fumaceiro provocado pelo tiroteio, buscando alguma resposta plausível.
Albert Pine dizia que o que fazemos para nós morre conosco, o que fazemos por outros e pelo mundo continua e é imortal. O que o homem faz, quando faz, só faz movido pela maldade, e é aí que ele mais se sobressai; a bondade é uma pequena sombra sobre a vasta luz que ilumina o seu caminho, e não importa se este caminho o leva ao morro ou ao asfalto, ao centro urbano ou a periferia, posto que a estrada em si não é boa ou ruim, mas sim quem sobre ela caminha.
Seus olhos fixam na imagem de Cristo colocada atrás do altar da igreja, e, por alguns segundos, esperam, não a resposta para o que estava ocorrendo, mas o milagre da ressurreição, não de quem já estava morto, mas da bondade de quem vivo estava. Enfim, ele chora, Cristo estava morto, também.
Platão um dia disse que perdoamos uma criança com medo do escuro, mas a grande tragédia da vida é o homem ter medo da luz. Um pequeno halo de luz se encaminhava em sua direção, vindo da entrada da igreja; ele não teve medo, dentro dele havia uma certeza de que era ela.
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Tristeza, indignação, impunidade. Sempre me encanto com os assuntos que você explora - e como os explora bem! Um mestre na arte de contar histórias. Ansiosa para ler a segunda parte... Um beijo da mana, Deia.
ResponderExcluirVivemos em um mundo que não temos vergonha de sermos ruins, de dizermos desaforos, de brigarmos no trânsitos, de matarmos....mas temos vergonha de elogiar e de sermos elogiados, temos vergonha de sermos bons, de falarmos de sonhos, de coisas que realizamos...é mais fácil falarmos de maldades, de doenças, de desgraças....
ResponderExcluirQue a bondade ressurja em nossos corações. beijo
Eder, amigo!
ResponderExcluirQuantas vezes buscamos a felicidade no exterior, longe de nós, quando na realidade está tão perto, mas tão perto que nosso medo de olhar para dentro de nós mesmos não nos permite ver...
E essa felicidade vem conectada, diretamente, com a felicidade que proporcionamos aos demais, ao próximo, ao irmão, ao vizinho... tão simples, e tão complexo ao mesmo tempo!
Gostei! Gostei muito!
Beijos, flores e muitos sorrisos!
um texto otimo, e mesmo se é verdade, pessimista demais!!!!
ResponderExcluirum gde beijo
Triste conto amigo. Triste e verdadeiro. Quanta vida se perde sem sentido, ou melhor, cujo único sentido é dar sentido a vida.
ResponderExcluirbeijos
Olá Eder,
ResponderExcluirMuito bom texto, nutro a esperança que mude, que mude muito em nossa realidade.
Concordo com Paula Barros, me desculpe mas vou fazer tuas, minhas palavras e exatamente isso.
Eder, intensidade tb não falta nem um pouco aqui.
Beijo meu
O ser humano está correndo o risco de perder o contato com sua própria humanidade, com seus valores mais dignos como a generosidade, cordialidade, empatia e bondade, por ex.. Estamos nos acostumando com a violência de tal forma que ela só nos atinge quando acontece dentro de nossa casa. Ouvimos falar em chacinas e massacres em escolas, nos incomoda, mas não nos mobiliza nem nos paraliza. Acho isso um sinal dos tempos muito preocupante. Enfim, seu texto fala com muita verdade dessa realidade que parece tão distante, mas que está assustadoramente mais próxima a cada dia.
ResponderExcluirEspero a 2ª parte.
Beijokas.
Um tanto funebre e desesperançoso, mas acontece pelos morros da vida. Um abraçao.
ResponderExcluirEder, cada vez que entro aqui eu saio embriagada de suas belas palavras, seja em forma de poesia, ou de crônica dolorida, feito essa... beijos meu querido.
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ResponderExcluirMuito intenso o seu texto! Gostei muito... Em texto curto, você explorou várias realidades, físicas e emocionais... Ficamos sempre sem resposta, não é meu amigo?
Obrigada, pela excelente leitura!
Beijos de luz e carinho...
Zélia(Mundo Azul)
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A intensidade do texto foi arrancando de mim suspiros... Como eu queria que tudo fosse diferente e todos nós nos tratassémos como irmãos!
ResponderExcluirAfinal...Diante dos olhos do nosso pai maior é assim que somos!
Um abraço carinhoso
...pensar que muitas vezes escondemos
ResponderExcluirnossa bondade para não corrermos
riscos diante da frieza humana.
bjokas, querido pensador!
Para entender a 2ª parte(onde cheguei) venho ler a 1ª e vejo que valeu à pena porque aqui você expõe sentimentos contraditórios que envolvem muitos de nós humanos,isto é, a esperança e o pessimismo diante de si e da vida.Ainda bem que o desfecho para esse personagem foi do jeito que gosto(não que tivesse que ser)!
ResponderExcluirA não aceitação está na primeira frase desse texto.
ResponderExcluirE então nasce a maldade. "a bondade é uma pequena sombra sobre a vasta luz que ilumina o seu caminho" Uma pequena sombra num decerto de violência.
Eder, o texto é forte e toca de forma intensa na ferida. Você aborda o que todos gostaríamos de esquecer. Mas como, se é realidade?
Mas... não tenhamos medo da luz. Ela existe.
Abraço fraterno, meu escritor!