Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Aonde o sol se esconde - 4ª Parte

     Qual de nós nunca brincou de mocinho e bandido e sempre quis ser o mocinho por saber que no final o mocinho sempre vence? Qual de nós nunca quis ser o mocinho sabendo que no fim da história a heroína sempre fica com o mocinho?
     A igreja toda enfeitada de rosas brancas estava lotada; ansioso, o noivo aguardava no altar o início da celebração; seu casamento era a última cerimônia a ser realizada. Oscilando a cabeça, ele autorizou o desligamento da energia; assim que as luzes começaram a apagar, as duas mil velas postas em candelabros e distribuídas por toda a igreja foram acessas. Inquieto, ele andou de um lado para o outro, ora limpando o suor do rosto, ora batendo a ponta do sapato no assoalho de madeira chamando a atenção de todos.
     A força policial se preparava para mais uma incursão ao morro determinada a eliminar qualquer suspeito. A operação era de risco, como sempre era toda subida policial ao morro, mormente se fosse feita à noite. O Caveirão já estava ligado, pronto para partir. Com todo o aparato que aquela operação exigia, a polícia dava a entender que iria para a guerra. E ia.
     Marcha soldado, cabeça de papelão, quem não marcha direito, cai na ponta do facão. O garoto, tamborilando na mesa, cantava uma das cantigas que sua mãe lhe ensinou no pouco tempo que estiveram juntos. O dia estava sendo inusual para ele, o mais esperado de todos os dias de sua vida, o momento que ele esperava para vingar a morte de seus pais. O traficante lhe deu o AR-15, não lhe disse nada, apenas olhou dentro de seus olhos com a certeza de estar vendo um homem, passou a mão na sua cabeça, como sempre faz, e o deixou sozinho. A arma dava a entender que ele iria para a guerra. E ele era apenas uma criança.
     Havia um silêncio incômodo no morro, uma quietude imposta, sabendo-se de antemão que logo a balbúrdia imperaria, para depois um silêncio pior permanecer, o silêncio de quem vela os seus mortos. Fogos de artifícios estouraram no céu avisando que a polícia ia subir o morro, pipas povoavam o céu alertando os moradores que deveriam ficar em suas casas. Sabendo da batida policial, antecipadamente, os traficantes alertavam aos moradores o que estava por vir. O palco estava armado para a guerra.
     O padre pedia silêncio, pois a cerimônia seria iniciada.
     A tropa preparada começava a invadir o morro.
     Silente, o garoto fazia suas preces com as duas mãos postas sobre o cano do AR-15, e a cabeça sobre as mãos. Um tiro ecoou na rua, foi o sinal que ele precisava para sair.
     Todos olharam para trás, sem exceção, quando o organista tocou “Forever in Love de Kenny G”. A noiva, de vestido branco bordado com linha de seda, coroa de rosas naturais branca prendendo os cachos do cabelo, entrou na igreja iluminada pelas velas que bruxuleavam no candelabro da entrada da igreja até o altar. Atraída bela beleza da noiva a luz da vela ganhou mais vida e derramou sobre ela o seu lume a nobilitando; o noivo entre risos nervosos a aguardava, silente, com as mãos no bolso da calça e gotas de suor permeando sua face.
     Anjos infernais saiam dos canos das armas, tanto da polícia como dos bandidos, a procura dos filhos de Deus; os corpos no chão mortos, nenhum fardado, era a prova de que não havia bala perdida. A polícia aproximava da igreja deixando para trás rastros de destruição. O morro as escuras necessitava de luz, e o único lume que bruxuleava era o do interior da igreja, chamando a atenção da tropa policial.

7 comentários:

  1. Os detalhes e a precisão de alguns trechos, me faz parecer que estou vendo um filme, ou presente nas cenas.

    Quanta imaginação, e a forma de escrever que prende a atenção.

    abraço.

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  2. como sempre otimo, mas tbem terrivel!
    beijos

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  3. "havia um silêncio incômodo no morro...! Eder, eu leio e vejo as imagens. Tudo acontece aos meus olhos, como se as cenas estivessem sendo interpretadas. Teu texto é muito bom, querido amigo, ele toca demais. Lindo e triste! Grande beijo. E obrigada pelo carinho... sempre!

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  4. Olá Eder,

    Fiquei tensa!
    Já imaginei a noiva toda ensanguentada, o pior..rs
    Tua escrita me prende, você tem muito talento.

    Beijo meu

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  5. Muito bom. Estou gostando muito de seguir seu conto.
    beijos

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  6. Uma tragédia anunciada! Tenso e triste!
    Ao próximo!
    Beijokas.

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  7. É sim triste,mas deixando aquele gosto curioso em nós leitores.Vou prosseguindo na leitura pelos próximos capítulos...Se pode dizer asssim?!
    Abraços,

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