Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Apocalipse 2012 - Página 5


Pra você juntar/E queria sempre achar/Explicação pro que eu sentia./Como um anjo caído/Fiz questão de esquecer/Que mentir pra si mesmo/É sempre a pior mentira,/Mas não sou mais/Tão criança a ponto de saber tudo - Legião Urbana.

   Tartarugando de um lado para o outro, ora espreitando pelo buraco da fechadura, ora tentando escutar, com o ouvido direito colado a porta, o que se passava dentro do quarto, Petrus, por duas vezes, tentou entrar, mas receoso de infringir a ordem dada pela parteira, sentou-se e inquieto permaneceu com os olhos vidrados na porta.

   Os flashes da lâmpada em intervalos intermitentes, devido ao seu defeito, não permitiam a parteira ter a nitidez das imagens que lhe chegava aos olhos, por isso ela foi à janela e a abriu para ter mais luminosidade. Do lado de fora da casa, a escuridão era mais intensa. Ela perscrutou com os olhos até aonde as suas vistas permitiam e reparou que o nevoeiro havia desaparecido, não obstante, ao olhar para o céu, o viu coberto por um manto negro, então, a razão tomou conta dela fazendo notar que algo de estranho estava acontecendo ali, desde o momento que chegara, ela só presenciou trevas e destruição.

   Se a parteira tivesse obedecido à razão, desprenderia os pés do chão e passos a passos teria caído fora dali, não que isso a salvasse, pois lá fora o cenário era pior, porém, iria com a sensação que tentou se salvar, contudo, o recém-nascido lhe prendia ali, inquietava-a não saber o que lhe aconteceu.

   As sombras distorcidas refletidas nas paredes do quarto não a amedrontavam, pois sabia que na escuridão, o medo criava monstros. Percorreu os olhos por todo o quarto até pará-los em um borrão enegrecido pendurado no caibro. Cerrou os olhos, apurou as vistas para melhor enxergar e não acreditou no que viu. Trêmula, suas pernas não aguentou o peso do corpo e a levou ao chão, desacordada.

   O nevoeiro havia baixado, a cidade, aparentemente, voltava ao normal, porém permanecia em escuridão total, sob o céu anjos Shaitans, formando um infinito manto negro, aguardava ordens para atacar. Dentro da casa, Furiosus e Iratus esperavam os instintos animalescos de Lucius vir à tona para provar o início da sua maturação.

   Entre os dois anjos Shaitans se encontrava Lucius pendurado no caibro de cabeça para baixo, segurando-o com as garras dos pés, o seu corpo estava maturando, asas se delineavam embaixo da pele tentando vir à luz. Contudo, havia uma luta licenciosa do sangue humano para estancar a maldade que o plasma do Senhor das Trevas operava no seu corpo, a escuridão ainda não havia atingido o seu espírito. Quanto maior a quantidade de outro sangue humano que não fosse da sua linhagem familiar, mais rápida seria a aceleração do processo de maturação, consequentemente, Lucius adquiriria aspectos diabólicos.

   Furiosus sabia que o corpo desacordado da parteira no chão pulsando sangue cálido por suas artérias não seria o suficiente para acelerar o processo de maturação. O da mãe, morta na cama, Lucius não poderia usar, pois ele foi usado na sua feitura. O do pai só se fosse necessário, mesmo sabendo que ele desaceleraria o processo, no entanto ele precisava de tempo até eles chegarem à casa marcada com a cruz e a estrela. O sangue do recém-nascido completaria o processo de maturação.

   Duas cadeiras de ferro com assento e encosto entrelaçados por fios de polietileno nas cores azul e vermelho; uma televisão desligada colocada sobre um tampo de madeira jacarandá adaptada a um pé de mesa de ferro de máquina de costura Singer servindo como rack; um cesto de vime contendo algumas revistas de fofocas sobre celebridades em um dos cantos da parede eram as únicas mobília da sala; mais adiante o buraco na parede, Petrus, com a mente presa na preocupação do nascimento do seu filho, não percebeu. Afoito, folheava as páginas da revista umedecendo os dedos em sua língua, sem dar atenção para o que estava escrito. A espera o inquietava. Impaciente, ele cruzou as pernas da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, amiúde. Ao entrecruzar as pernas, Petrus fazia um ruído agudo devido o movimento da cadeira de ferro no piso. Imperceptível a qualquer mortal que estivesse a poucos metros dali, o ruído não era para quem tem ouvidos apurados. Lucius o ouviu, o seu instinto animalesco estava apurado, ele já sabia que precisava de sangue para a sua maturação. O destino da parteira, Furiosus e Iratus já sabiam que estava selado, o de Petrus acabara de saber quando Lucius mostrando as suas presas apontou em direção da porta.


   Lá fora, na rua, o vento levantava a poeira do chão, o nevoeiro tinha dispersado havia tempo, o sol estampava no céu o seu brilho, porém, o manto negro impedia o seu reflexo. Cálido e totalmente escuro, o dia surgia com os seus sons característicos vindos das casas: latidos de cães, cantos de galos, balidos de ovelhas, mugidos de gados e os cantos entoados pelos pássaros. Aos poucos, de dentro das casas, surgia o ruído de água percorrendo os canos, o chiado ao romper as torneiras ou o da descarga do vaso sanitário. Noutras casas apresentava o ruído característico de chuveiro ligado, sinal de que, aparentemente, a vida tomava o seu curso normal. Contudo, uma única casa não apresentava esses ruídos, e a parteira seria testemunha do que ocorreria ali.


   Furiosus retirou o pente de balas de sua arma e inseriu o pente com cravos. Movimentando o dedo indicador, ordenou a Iratus que erguesse a parteira. Iratus desprendeu do caibro imediatamente e voou em direção ao chão, abraçou a parteira, ainda desacordada, com as duas asas levantando voo, suspendeu-a no ar, abriu os seus braços e a largou. Imediatamente fechou as suas asas, embicou e desceu com os pés juntos, parou no ar assim que a parteira começou a cair, flexionou os joelhos e arremessou os pés em direção do tórax dela. Com o impacto, a parteira voou na ascendente indo de encontro à parede. Lestamente Iratus espargiu o pó do sono para ela não despertar; enquanto isso, Furious disparava a sua arma pregando mãos, braços, pernas e pés da parteira na parede. Com as garras dos pés Iratus fez a sangria no pescoço da parteira. Lucius, até então quieto, teve seu instinto aguçado pelo cheiro de sangue fresco. Com os caninos à mostra, ele se jogou no pescoço da parteira.

   O ruído despertou em Petrus a curiosidade, ele foi em direção à porta e abaixou a maçaneta tentando abri-la, um pó denso espargiu do buraco da fechadura deixando sonolento. Sem poder de ação, Petrus prostrou na cadeira de ferro.

   Aos poucos a luz lhe foi tirada dos olhos como se tivesse faltado energia, porém era a vida que lhe faltaria em poucos instantes. A parteira não acreditou no que estava vendo, o recém-nascido que até poucos minutos atrás estava pendurado no caibro, agora era um menino a lhe sugar o sangue. Quando finalmente ele a soltou, tirando os cravos que a prendia na parede, ela viu o seu corpo espatifar no chão. Seus olhos agora enxergavam com clareza, o menino se tornou um rapaz, horrendo, com garras nos pés e mãos, caninos tão afiados como um picador de gelo e asas querendo brotar de sua pele. Ela se perguntou quem era aquele menino, e por qual motivo ele aceleradamente se transformou em um rapaz com aparência diabólica. Antes que as respostas lhe aparecessem diante dos seus olhos, ela viu um halo de luz e de dentro dele surgir os Servos dos deuses que vieram lhe buscar, pois ela era um espírito de luz. Mesmo assim, ela lutou para não ir, precisava salvar aquele rapaz. Então, por escolha própria, ela ficou.

   Furiosus armou o recipiente Tenebrae para capturar o espírito da parteira, uma sombra enegrecida saiu do mesmo perscrutando a esmo, porém não o encontrou. Diante deste imprevisto, ele acelerou os seus afazeres para finalizar a sua missão. Armou o caldeirão Diabolus, picou a raiz de valeriana cultivada nos campos do Senhor das Trevas, adicionou o plasma do mesmo, acionou o sistema vibratório enfiando a espada Daemo no lugar apropriado, depois ligou o processo de maceração e por fim o de evaporação. Após alguns segundos, Furiosus tinha pó o suficiente para espargir sobre a cidade. Cismado, ele foi lá fora, olhou minuciosamente a rua buscando movimentos suspeitos, fixou o olhar no manto negro e reparou certa inquietude nos anjos Shaitans. Ao entrar à casa, não perdeu tempo e retirou o pente da arma, e deste todas as balas, inseriu nelas o plasma do Senhor das Trevas e as fechou recolocando no pente e este na arma, destravou a pistola e a guardou no coldre. Sabia que o anjo Hesediel não tardaria a chegar com a sua protegida. Ao pensar nisso, uma gota de suor escorreu do seu rosto, Iratus, atento aos movimentos de Furiosus, percebeu, e sentiu o mesmo medo, porém, a sua sudorese eram nas mãos.

   Iratus colocava o caldeirão Diabolus desarmado na sua mochila, enquanto Furiosus colocava o pó do sono no corno do Senhor das Trevas fechando o bocal, a sua arma no coldre direito e o recipiente Tenebrae no coldre esquerdo, quando foram surpreendidos pelo espírito da parteira adentrando o quarto em forma espiral e atingindo Lucius no peito. Lestamente, Furiosus destravou o coldre esquerdo armando o recipiente Tenebrae e o arremessou em direção a Lucius. Assim que o recipiente Tenebrae deslizou pelo chão, de dentro dele saiu uma sombra enegrecida com tentáculos na ponta agarrando o espírito da parteira e o desprendendo do peito de Lucius. A sombra e o espírito lutavam freneticamente derrubando tudo que encontravam pelo quarto. Furiosus pensou em usar a sua arma para extinguir de uma vez por toda o espírito da parteira, mas reteve o impulso, pois desperdiçaria munição em um espírito sem valor, aquelas balas tinham dono, o espírito de Hesediel, além disso, Tenebrae daria conta do recado.

   A sombra abraçou totalmente o espírito e este tal uma vela quando vai perdendo o lume quando o pavio chega ao fim extinguiu-se deixando um tênue fio de fumaça que dispersou no ar. Ao abaixar para pegar o recipiente Tenebrae, Furiosus percebeu transformações em Lucius. Sem perder tempo, Lucius se arremessou em direção à porta arrombando-a.


Continua domingo às 12hs00min

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Imagem Google

28 comentários:

  1. Eder,sua imaginação é ilimitada!Que conto assustador!Confesso que não sei como consegue descrever cenas tão fortes,de lutas,de sangue,torturas...ai,meu Deus!Sem dúvida,é um talento especial!Vamos ver o que acontece depois!bjs e boa quarta!

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    1. Anne, obg pelo comentário elogioso.
      Meu processo de criação só é feito qdo estou inspirado. Não me forço a escrever nenhum texto. Antes de ganhar palavras, vivencio todas as cenas, interagindo com as personagens. É isso, Anne. Bjos.

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  2. ...ai ai

    onde será que tudo isso vai dar???

    imaginação e das mais férteis aqui
    eu já ví que tem...

    smacksssssssssss, alma linda!

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  3. E a luta continua, em sua detalhada narrativa. Sempre vislumbro uma luz que ainda vai se impor. Mas aguardo os caminhos que o escritor escolheu. Abraços!

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  4. Olá!Bom dia!
    Éder
    Mais uma página intensa, cheia de novidades!
    Confesso, regozijei-me, com a tentativa da parteira que nos doou este espetáculo , cheia de idealismo , tentando salvar , porém vi que nessa luta travada entre a sombra e o espírito de luz, a vitória da escuridão...
    ( máquina Singer, ainda tenho uma de minha mãe)
    Obrigado!
    Ótima quinta feira
    Abraços

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    1. Felisberto, vc acha q a máquina Singer entrou na história pq? Eu tb tenho uma, só o pedestal, herdada da minha mãe. Abçs. Boa noite.

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  5. Quando eu ouvi pela primeira vez o disco Dois, da Legião Urbana, imediatamente tomei de assalto essa música para mim e nunca mais a larguei. "Quase Sem Querer" é um dos temas da minha vida, ao lado de Pétala.

    Menino do céu! A imagem da pobre parteira sendo pregada está aqui, vivíssima na minha imaginação. Esses cabras não são de brincadeira. E que mêda desse morcegão na imagem.

    Manda mais!
    Beijo.

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    1. Milene, vc não vai acreditar, quem me apresentou a Legião para mim foi a minha mãe. Ela achava q era o Jerry Adrianni. Amei de cara e Quase sem querer virou um mantra prá mim. Até hj a minha mãe diz q a Legião é a trilha da minha vida.
      Esse anjos do mau são cabras ruins.
      Tem medo de morcego, é pq vc não conhece o Drácula, ou conhece? Bjos.

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  6. Eder, voltarei para ler o capítulo com tempo, só vim até aqui para responder seu comentário de hoje no meu espaço...Vai passar sim, meu amigo. Acreditar nisso é primordial para começar a passar. E quando passar você me conta. Vamos dar boas risadas das fases escusas. Um abraço!

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    1. Obg, Bia, pelo apoio. Bia, se tem uma coisa que eu gosto em mim é q eu vou aos pouco diluindo problemas, mágoas e etc. Final de semana, pode ter certeza, estarei melhor.

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  7. Que diabo de senhor das trevas é esse? Cultiva valeriana? Usou-a no preparado para espargir sobre a cidade? Pra quê? Aposto que ele tá afim de deixar o povo mais nos conformes, porque sono mesmo tá difícil com a vale viu! Quem sabe até pra gerar alguma empatia com ele não é? Afinal o Anticristo será muito querido pelo povo, sabemos disso. Que negócio é esse de armas carnais no plano espiritual? Olha, você sem pedir licença me jogou de lá pra cá, de cá pra lá!Fiquei O.o! Faz favor né? Para com esse sobe de desce e resolve logo essa parada nos ares vai! Desse jeito vou ter que interferir com meus super poderes!kkkk

    Apesarrrrrrrrrrrr de estar assim meio.. sabe né O.o! Esse episódio até que saciou um pouco mais minha sede de blood!!! Gr. Bj.! ÉD!

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    1. Menina maluquinha, q diabo vc bebeu, achou q vc tomou alguma valeriana...rssssss. Os anjos maus estão no plano terreno, para eliminar o córpero precisa de arma terrena, tanto é q qdo foi preciso eliminar o espírito ele usou a Tenebrae q é uma arma espiritual.
      Pelo amor de Deus, não usa o seu superpoderes, senão, não vai sobrar carne sobre carne...rssssss
      Bjos, Menina maluquinha.

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    2. Ahhhhhhh sim agora entendi! Acho que meus fios loiros já começam atingir meus neurônios! rsr isso é claro, é grave! Aff!

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    3. Muda a marca da tintura, os neurônios vicia fácial...kkkkkk

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  8. Olha, Eder, se sua crônica fosse um filme tenho certeza que a classificação seria de 16 anos. Dá medo só de ler. Eu não veria um filme desse, mas como é só escrito, leio com prazer. Abração!

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  9. assusta assusta assusta!
    chega de sustos aqui ja tive bastante! mas como sempre escreve tao bem!!!!
    abraços

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  10. é, Éder tua facilidade para o terror é incrível. acho que tens que seguir por este caminho. consegues uma narrativa que faz o leitor acompanhar a história quase que visualmente...
    Beijos

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  11. Demorei amigo, as coisas andam difíceis, mas a saudade apertou e vim deixar abraço bem grande e beijo também.

    Volto em uns dias para ler tudo que perdi, não posso ficar sem te ler tanto tempo porque sinto que estou perdendo tanta história boa! Volto logo pra ler todas.

    Beijos

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  12. Eder, desta vez demorei para comentar esta nova página, mas gostei imenso!
    A sua imaginação não tem limite e a sua prosa não tem imperfeição.
    Excelente!

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  13. Concordo com o que disse S.Santos pois na maioria das vezes que leio seus textos sinto certo pavor das cenas que vou imaginando enquanto leio e fico ainda assim interessada para que de algum modo o autor dê um desfecho feliz apesar de todo o enredo violento.
    Abraços e uma semana feliz por aí!

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  14. Obg, Bergilde, uma semana iluminada para tdos aí. Bjos.

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