Está presente na minha memória, com uma certeza absoluta que nunca daí sairá, a perda do meu segundo filho. Está lá no canto da memória a doce voz da médica dizendo a minha esposa: “Há uma vida dentro de você, mãe”. E não importa quanto tempo eu viva, tanto imagem quanto voz viverão comigo. Passado um mês veio o susto. Sangramento. O tom da voz da médica agora era de preocupação: “A um problema mãe, você está perdendo seu filho”. O quê dizer nestas horas, será que as lágrimas dos dois diziam por si só? Havia uma esperança que o medicamento o segurasse, uma tênue e fraca esperança.
Minha filha desde o nascer sempre precisou de cuidados médicos. Não importava o dia ou a hora e nós estávamos a levá-la ao hospital devido problemas alérgicos. A idas e vindas eram tão constantes que enfermeiros e enfermeiras já a conhecia, a tratava de nossa princesinha. Numa dessas idas (ela tinha dois anos), quando é o desespero que te guia, eu, dirigindo, fui de encontro a um ônibus que vinha em sentido contrário. Lembro de, como se tivesse acontecendo agora, minha esposa gritando o nome da minha filha e me perguntando o que estava acontecendo. Vi as ferragens do carro se contorcendo vindo em direção ao meu rosto, solto o volante do carro para proteger o rosto e o carro dá um giro de trezentos e sessenta graus batendo no poste. Deste acidente ficou a cicatriz na mão e no lado esquerdo da cabeça e o agradecimento de não ter perdido esposa e filha.
Noutro momento, quando minha filha tinha quatro anos, já grávida do que seria nosso segundo filho (sempre o tive e terei como filho apesar de ter sido gerado por apenas um mês), minha esposa levando-a no colo até o hospital sentiu dores na altura do abdômen. Durante dias após o aborto ela se culpou achando que aí estava a causa do mesmo. Preferi, e a convenci do mesmo, apesar de não ser plausível, a versão da médica de que a própria natureza se incumbia de expelir um feto degenerado.
Após uma semana de medicação, quando a tênue e fraca esperança evadiu, o médico num portunhol canhestro falou que a enfermeira acompanharia minha esposa até a sala de cirurgia para limpeza do útero. Para surpresa do médico e minha, minha esposa falou firme com os punhos sobre a mesa: “Não”. Foi neste momento que ele nos olhou, e, acho, percebeu que estava tratando com seres humanos. Ele nos deu no máximo uma semana. Saí dali certo que não o tinha mais conosco, mas foi necessário para minha esposa ir para casa para chorar o quanto fosse necessária a perda do nosso segundo filho. Noutro dia ela me chamou para ir ao hospital e disse com as mãos no ventre: “Aqui não há mais vida”.
Tudo isso me veio agora porque de quatro mudas de rosas plantadas nenhuma vingou, e quando se faz à semeadura, sempre esperamos que o fruto vingue.
Ouço a voz da minha filha, o choro do meu terceiro (o que não nasceu sempre será o segundo) filho. São as vozes do chamamento, e lá vou eu regar a Rosa – assim chamo minha filha -, e o Cravo – assim chamo meu terceiro filho -, afinal fruto vingado tem que ser cuidado e amado.
05/02/08
Os pensamentos, as experiências de vidas relatadas das minhas personagens não são reflexos dos meus pensamentos e experiências, mas sim, peças do mosaico que forma o ser humano. Os meus textos não intentam a polêmica, mas nos chamar à reflexão. Deixo o meu email para quem quiser trocar ideias, compartilhar textos e interagir: gotasdeprosias@gmail.com
sábado, 8 de maio de 2010
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Eder, em primeiro lugar, eh preciso muita forca para compartilhar uma historia de vida com tantos acontecimentos. Em segundo lugar, me emocionei ao ler que voce para sempre mantera na memoria o filho que nao conseguiu nascer para viver com voces. E, com muito respeito, desejo a sua familia, que ja experimentou tantos sentimentos nesses anos que se passaram, um dia das maes com a alegria da presenca de todos voces nas vidas uns dos outros. Que seus filhos se orgulhem dos pais que voces sao. Um abraco com muito carinho, Deia
ResponderExcluirUm grande beijo pra vocês e um espacial Dia das Mães, para sua esposa.
ResponderExcluirTambém perdi um filho com menos de um anos de idade nasceu co HIDROCEFALIA e em menos de um anos passou por seis cirurgia. Muito forte o texto é bom passar para frente desabafar !
ResponderExcluirEder! Me emocionei ao ler seu texto.
ResponderExcluirQuantos momentos marcantes. Mas a alegria volta quando olho para a Rosa e para o Cravo. Que sorrisos, que crianças lindas. Parabéns, Eder!
Beijo
Putz Eder...quer acabar com os amigos menino!! Quanta emoção num post só...
ResponderExcluirFiz uma posatgem uma vez sobre uma colega que perdeu dois filhos seguidos, um com 11 meses e o outro com 1 ano e 4 meses....da mesma doença...imagina!
Quatro anos se passaram e hoje ela esta comemorando oda das mães ao lado de um menino de 7 meses...
Oro por eles sempre que posso e esses dias ela foi na agencia me mostra o bebe..fiqui super feliz e na torcida...
Curta o domingo de voces ai ok e agora amenizada as ondas da emoção, te falço uma proposta...manda um pocuo desse seu jabá de corda ai, que te envio um pouco do meu chili aqui...rsrs
Feliz Dia das Mães pra vocês...
Mãe... São três letras apenas
As desse nome bendito:
Também o Céu tem três letras...
E nelas cabe o infinito.
Para louvar nossa mãe,
Todo o bem que se disse
Nunca há de ser tão grande
Como o bem que ela nos quer...
Palavra tão pequenina,
Bem sabem os lábios meus
Que és do tamanho do Céu
E apenas menor que Deus!
Mãe (Mário Quintana)
Um abraço na alma...beijo no coração amigo....
Bom dia, meu querido. Relendo esse texto que amo, aproveito para deixar um beijo enorme e cheio de carinho para a querida Mari. Que vcs tenham um domingo iluminado junto do cravo e da rosa :)
ResponderExcluirAh, amigo.. história parecida tirando o acidente, mas o meu bb estava bem maior, meu segundo filho.. faz um ano e hoje não poderia ser diferente, por momentos fiquei triste, pois lembrei que ele tb poderia estar conosco. Mas aceito que tinha que ser assim, cada um com suas dores. Certo que nunca esquecerei nem da dor emocional e tb da dor física que passei. Parabéns a sua esposa pelo dia das mães. Muitas felicidades. Bjão.
ResponderExcluirAh, amigo.. história parecida tirando o acidente, mas o meu bb estava bem maior, meu segundo filho.. faz um ano e hoje não poderia ser diferente, por momentos fiquei triste, pois lembrei que ele tb poderia estar conosco. Mas aceito que tinha que ser assim, cada um com suas dores. Certo que nunca esquecerei nem da dor emocional e tb da dor física que passei. Parabéns a sua esposa pelo dia das mães. Muitas felicidades. Bjão.
ResponderExcluirSei bem o que vocês pasaram, se um dia tiver coragem conto sobre o que me aconteceu.
ResponderExcluirQue bom ter seu cravo e sua rosa e sei que seu jardim é lindo e florido.
...traigo
ResponderExcluirsangre
de
la
tarde
herida
en
la
mano
y
una
vela
de
mi
corazón
para
invitarte
y
darte
este
alma
que
viene
para
compartir
contigo
tu
bello
blog
con
un
ramillete
de
oro
y
claveles
dentro...
desde mis
HORAS ROTAS
Y AULA DE PAZ
TE SIGO TU BLOG
CON saludos de la luna al
reflejarse en el mar de la
poesía...
AFECTUOSAMENTE
GOTASDEPROESIAS
ESPERO SEAN DE VUESTRO AGRADO EL POST POETIZADO DE CHOCOLATE, EL NAZARENO- LOVE STORY,- Y- CABALLO, .
José
ramón...
Meu Amigo... nesses momentos, através das histórias da nossa vida, vamos entendendo mais e melhor as razões de Deus para colocar em nosso destino pessoas como você.
ResponderExcluirUm filho a partir do momento em que é concebido em nosso ventre, já se torna parte de nós.
Compreendo cada palavra aqui descrita e sentida.
Que Deus abençoe muito a sua família.
Um beijo carinhoso
Olá, meu amigo...
ResponderExcluirlí o seu post com bastante atenção e fiquei emocionado.
Fica aqui minha admiração pelo pai e mãe maravilhosos que são vocês.
Chorar pelo filho que não nasceu é emocionante isso. Desejo todas as bençãos de Deus para sua família e tenho certeza que Deus os ama muito.
vocês são especiais.
Tenha um dia cheio de amor, luz e muitas energias positivas.
Abraços!
Emocionante sua história.
ResponderExcluirParabéns!
Abraços
Lu
www.textos-e-reflexoes.blogspot.com
Grande Éder,
ResponderExcluirsem palavras, meu caro. Essas coisas extrapolam toda a poesia.
Continuemos, regando...
A vida há de nos colorir.
(Só não me faça chorar, meu velho)
Abraço forte.
Amigo Eder,
ResponderExcluirVim agradecer a visita e encantar-me com o que aqui encontro...
Este texto é simplesmente comovente, lindo ao extremo e difícil de esquecer.
Quanto amor há em teu coração e isso é muito bom, e muito bonito!
Beijos, flores e muitos sorrisos... sempre!
Que escrita mais linda poeta, difícil conter a emoção, a reverencia por essa sua palavra semente, sementeira que nos traz verdades de seu Jardim, também nosso, da nossa humanidade, da nossa dor, do nosso desvelo, do filho amado, semente única, para sempre contigo, conosco, com nossa humanidade, com nossa verdade, parte de nós, na poesia que floresce e refloresce na alma...obrigada pela partilha, imenso abraço! Lilian
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